Uma classificação funcional de normas jurídicas

O que procuramos, ao ler as leis e demais entes legislativos, é algo extremamente prático.

Uma classificação funcional das normas jurídicas, com a ressalva de que toda classificação é precária, as dividiria em cinco grupos, sendo que os dois últimos seriam interligados: Normas organizatórias; Normas de competência; Normas técnicas; Normas de conduta; Normas sancionantes.

A tipologia persegue o desejo de ser funcional, adequada à prática do direito. Busca escora teleológica. Efetivamente, o que procuramos, ao ler as leis e demais entes legislativos, é algo extremamente prático. Em real verdade, estamos procurando saber se alguém, pessoa ou órgão, é competente para isso ou aquilo, ou como é ou deve ser a organização das instituições, órgãos e pessoas. Quando não é assim, estamos procurando saber como se deve proceder em certas circunstâncias para realizar a ordem jurídica, ou perquirindo se existe algum dever a ser imputado a alguém, ou se deve ser aplicada a alguém determinada sanção. Vale dizer, o direito existe para instituir e organizar (normas organizatórias), atribuir competências (normas de potestade), criar deveres (normas de conduta ou de dever), punir as transgressões à ordem jurídica (normas sancionantes) e prescrever técnicas de realização da ordem jurídica (normas técnicas ou processuais).

É possível, portanto, operar a concreção do orbe positivo em normas de potestade, sancionatórias, de dever, técnicas e organizatórias.

Normas organizatórias – Instituindo os órgãos do Estado, as instituições e as pessoas. Desse tipo são as normas que prescrevem como deve ser o Estado Federal ou as que declinam os requisitos que deve possuir o ato jurídico ou uma sociedade por cotas de responsabilidade limitada para serem válidos, ou ainda as que definem quais são os pressupostos para um cidadão ser elegível ou comerciante, ou, ainda, ser maior, senador, presidente da República ou prefeito municipal. Neste âmbito se encontram as normas ditas atributivas de qualidades e as de “reconhecimento”, permitindo identificar se as outras normas pertencem ao “sistema”.

Normas de competência – Conferindo “potestades” aos sujeitos públicos e privados para produzir normas de comportamento, interpretá-las e aplicá-las voluntariamente, ex officio ou contenciosamente. Estabeleceriam como deveriam ser exercidas tais potestades, sua extensão e limites. Desse tipo são as normas que outorgam competência aos órgãos dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para a produção de atos funcionais legislativos, administrativos e jurisdicionais. De igual tipo as normas que investem os particulares de capacidade para praticar e para celebrar atos jurídicos constitutivos (testar, votar, contratar etc.).

Normas técnicas – Prescrevendo como devem ser produzidos os atos adjetivos necessários à vida do direito, como votar, sentenciar, interpor um recurso extraordinário, fazer um testamento válido, celebrar contratos, contrair matrimônio, discutir e votar uma lei complementar da Constituição. (Todas as normas processuais são técnicas.)

Normas de conduta – Destinam-se às autoridades e aos particulares. Desse tipo são as normas que estatuem comportamentos positivos e negativos, desde que ocorrentes certos pressupostos. São nucleares, no sentido de posicionar à sua volta o sistema jurídico. Se o direito teleologicamente busca o controle do meio social, é claro que indica quais são os comportamentos desejáveis. Indica-os, tornando-os obrigatórios, como no caso do dever tributário. As leis preveem a obrigatoriedade do seu cumprimento. Todavia, dita obrigatoriedade comportamental pode não ser expressa na lei. No caso do tributo, é. No caso de homicídio, não. A lei expressa apenas uma punição, ou melhor, a previsão de uma pena para o comportamento homicida. A norma que impõe o dever de não matar é implícita no sistema e, portanto, inexpressa na lei (mais uma vez, a diferença entre norma e lei). As normas de conduta ora impõem comportamentos positivos (é obrigatório pagar Imposto de Renda à União), ora estatuem condutas negativas (é obrigatório não matar). O caráter proibitivo é epifenomênico; se é obrigatório não matar, matar é proibido. Se é obrigatório pagar tributos, não pagá-los é proibido. O proibido e o obrigatório podem ser deduzidos de um outro tipo de norma que a seguir veremos, a punitiva. Isso induzirá a conclusões a respeito das normas de conduta, ao ponto de vê-las supérfluas, despiciendas ou desnecessárias. Isso jamais como queria Kelsen.

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