O mundo mutante e o Brasil

Sacha Calmon
Advogado, coordenador da especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e da UFRJ.

Precisamos de uma política pró reindustrialização com urgência e renovar a infraestrutura com privatizações.

Agora há um rival que não cessa de crescer econômica e pacificamente, a China. A Rússia desde há três séculos é vista com medo, mas nunca ameaçou a Europa, sendo invadida duas vezes, por Napoleão e Hitler, tendo simplesmente esmagado os invasores, que chegaram às portas de Moscou e retrocederam.

Napoleão, que só não conquistou o Reino Unido por causa das “muralhas liquidas”, o Canal da Mancha, avançou sobre a Rússia com 714 mil soldados e artilharia pesada, contingente formado por homens de 19 nações europeias subjugadas. Depois de um ano e dez meses de campanha, voltou a Paris com 7.800 mil homens apenas, estropiados e em frangalhos, e perda total de sua máquina de guerra (armas, cavalos e canhões).

Quando Wellington soube, atravessou o canal e avançou até Waterloo, onde liquidou com o que restava do Exército francês. A Rússia salvou a Europa de um tirano que chegou a se intitular rei, sendo republicano…

Outro que se gabava do sangue alemão, perdedor de duas grandes guerras em que se meteu, também passeou pelas ruas desertas de Moscou, mas voltou estropiado, depois de perder 70% de sua máquina da guerra nas tundras e planícies da Rússia.

A guerra foi tão cruenta no Leste, que em Lenigrado, hoje novamente São Petersburgo, num ano inteiro a Alemanha não avançou um milímetro, numa guerra de casa em casa (todos destruídos e reconstruídos) com livres atiradores que surgiam do nada.

Panzers (tanques) enormes foram nas planícies dizimados por cães que traziam bombas na barriga, treinados para buscar comida sob os tanques e chegar até eles correndo em ziguezague. Tinham no dorso um detonador que ao tocar na barriga do tanque o fazia explodir.

Os livres atiradores russos, vestidos de branco como a neve, seguiam a infantaria alemã com fuzis silenciosos a matá-los na retaguarda e os comboios táticos, com alimentos, munições e remédios. Na vanguarda, semeavam minas. A cavalo incendiavam os armazéns de víveres. Cerca de 30% dos alemães morreram de fome e diarreia e 20% perderam braços e pernas.

Lutar no Leste era como uma pena de morte. Em 1944, os russos já estavam na Alemanha, chegando a Berlim e muito além (70% do território alemão) quando houve o encontro com os ingleses e americanos.

O maior erro de Stalin foi devolver terreno aos aliados em Yalta e permitir dividir Berlim ocupada em quatro partes (EUA, UK, França e URSS).

Uma nova Guerra Fria se desenha se Biden continuar no seu intuito infantil de ser o papai do mundo, hoje dividido em quatro centros de poder. Os dois primeiros são EUA e Rússia. O outro par é formado pela China e a União Europeia.

A Ásia e a África foram exploradas pelos ocidentais. O Japão é detestado por todos, uns mais outros menos. Os africanos adoram a China. E todos temem o poder nuclear da Rússia e vencedora em duas guerras mundiais.

Biden, entretanto, está forçando uma mais intensa união entre a Rússia e a China, inquietando a Europa Ocidental a receber gás da Rússia a preços convidativos, por uma rede segura de gasodutos. Não lhe interessa brigar com a Rússia. Só existe um pensamento econômico no mundo atual: o capitalismo digital, de massa, a preços competitivos e a posse de minerais estratégicos. Biden quer cooptar a Europa Ocidental na sua ambição de liderança, uma intenção belicosa, sem sentido.
América do Sul, Brasil? Ele não está nem aí. Nem bom-dia nem boa-tarde, além de ser nosso rival no agronegócio.

Precisamos de uma política pró reindustrialização com urgência e renovar a infraestrutura – ferrovias, portos, estradas, redes elétricas e sanitização urbana (água e esgotos) – com privatizações.
Bolsonaro não fez nada disso. Inaugura obras alheias. É isso e nada mais. Muito gogó para esconder fracassos e inércias de sua péssima administração. Com a saída de seus ministros, começa-se a ver tramoias nas políticas de vacinas, contrabandos de madeira e desflorestamento proposital ou então interferências indevidas, como a que ocasionou a saída de Moro do governo. Da politicagem, ele próprio, o Moro, afastou-se, enojado e traído!

O Brasil precisa deixar ideologias de 40 anos atrás e partir para uma política interna e externa que traga resultados econômicos e novos mercados. Vale dizer que é preciso substituir esse capitão do Exército por um capitão da indústria nacional. É necessária uma política externa de cunho negocial com todos os países. Ideologias depois da destruição da direita radical (nazismo, fascismo, integralismo tupiniquim) e da esquerda ideológica (sovietismo e maoísmo) não fazem mais sentido.

O seu direitismo é político, econômico, fútil, religioso, piegas e fora de moda. E os EUA não lhe dão a mínima bola. A Europa o vê como mais um caudilho sul-americano. A China lhe oferta a Huawei e Bolsonaro parece refratar a ideia por quais razões ninguém sabe (idiossincrasia). A consequência é o isolamento do Brasil num mundo mudando para o 5G, a China à frente.

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