Diplomacia

Sacha Calmon
Advogado, coordenador da especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e UFRJ

O termo abarca um sem-número de atividades e exige diagnósticos precisos e medidas adequadas.

Os países costumam dividir a diplomacia em três grupos temáticos: reunir os amigos, desunir os inimigos e ganhar posições de mando estratégicas.

Alguns exemplos recentes ilustram nossos dizeres.

Em 72 horas, a Rússia retomou a península estratégica da Crimeia da Ucrânia, que adentra o Mar Negro, onde no lado exatamente oposto está a Turquia, membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), contrário à Rússia e a seus históricos aliados, Bielorússia e Cazaquistão, que usam o Mar Negro para atingir o Oriente Médio, o Canal de Suez e o Índico, a saída de seus navios mercantes e militares para o Mar Mediterrâneo e finalmente o Atlântico Sul (Península Ibérica, Grécia, Bálcãs) e o Oriente Médio ,onde têm bases na Síria. É de vital importância para ela.

Pois é, bastaram um “informe” do serviço secreto (um minuto) e as 72 horas que se lhe seguiram. A Ucrânia perdeu a Crimeia tradicionalmente russa (90% dos habitantes), entre eles os tártaros da Crimeia. No passado, foi entregue pelos russos, no tempo da União Soviética de Stalin, que aliás era da Geórgia (região do Mar Negro) à zeladoria da Ucrânia. Com o avanço da CEE e a possibilidade de entrar para a Otan, a Rússia agiu rapidamente.

Com o desfazimento da União Soviética e a manutenção de Kiew, um dos berços da Rússia na esfera política desta última, a Crimeia ficou com a Ucrânia. O namoro com a CEE atrapalhou.

A virada ao Ocidente para “participar da União Europeia”, tipo de canto das sereias, fez a situação mudar da água para o vinho. O resultado todo mundo soube. A Ucrânia perdeu a Crimeia em 72 horas, juntamente com a sua soberania. Esperneou à vontade. Hoje, está convencida de que errou, foi usada. Em política internacional, vale o cálculo e a experiência secular. Ninguém mais se interessou.

O mesmo ocorreu com o Tibet, alvo de uma campanha mundial de endossamento de sua religião e de sua independência. Em uma semana, a China o ocupou militarmente. Construiu uma estrada de ferro facilitando-a à China e enviou 100 mil pessoas para trabalhar no campo, fábricas e hotéis na região junto com suas mulheres. E ordenou ao Dalai Lama que aceitasse a situação. Hoje, ninguém fala mais dele, o Dalai Lama. Não há mais interesse.

O acidente estava usando-o em palestras e conferências e de nada lhe rendeu a sua propalada sabedoria. Em suas meditações, não lhe ocorreu que o Tibet pertencia à China desde há 3 mil anos e que Pequim jamais aceitaria o Ocidente no topo do mundo, com um Dalai Lama pró-ocidental em vez de neutro, como sempre foi.

A guerra – já disse um sábio – é a diplomacia por outros meios, outra dimensão, igual a falar mal do rival (fake news), mas mais comum do que se pensa. O racismo americano, por exemplo, é um horror tremendo na África e na Ásia, quando não nos Andes e aqui na América do Sul atlântica.

Entretanto, a diplomacia mais em voga hoje é a comercial, nula no governo Bolsonaro, preocupado com “ideologia” e um medo medonho do Lula. Talvez se candidate a senador…

O Brasil sempre foi elogiado pela sua democracia, tanto que lhe cabe abrir os trabalhos da Organização das Nações Unidas (ONU). Entretanto, no governo que está a se findar, viramos párias.

Ao Brasil, cabe integrar as nações andinas de fala espanhola com acesso de estradas que cheguem aos Andes, e revigorar o tratado do Mercosul, completamente abandonado, aglutinando a América do Sul.

São vizinhos próximos com culturas hispânicas e indígenas capazes de ser assimiladas pelo poder concentracionário do Brasil. Entretanto, nada fizemos!

É estultice afrontar a China, de longe a maior compradora e, pois, sustentáculo do nosso agronegócio. Deveríamos ter organizado caravanas de empresários à China e celebrado tratados. Nada disso ocorreu, muito pelo contrário. Não é apenas inabilidade política, mas ignorância.

Descabe a qualquer presidente opinar sobre as eleições argentinas ou norte-americanas. Pois não é que fizemos isso em prol dos derrotados? Foi nesse governo. Em vez de integração comercial, fizemos discursos ideológicos vazios e nos isolamos.

A nossa política externa deve ser revisada. Chegamos a ser removidos da posição de primeiro parceiro comercial da Argentina, pela China, a meio mundo de distância. Bolsonaro anunciando que vai à Rússia é uma boa iniciativa comercial. Isso tão logo acabe a crise com a Ucrânia. No particular, a China já se declarou aliada da Rússia e de suas precauções de não ser rodeada por nações hostis. A Rússia, de resto, é provedora de gás e petróleo para a Europa Oriental Ocidental, através de oleodutos e gasodutos, o que incomoda os EUA. A Alemanha é a principal compradora. Biden tem se queixado desse fato, que prejudica as companhias do Ocidente que trazem petróleo do Oriente Médio.

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