Capitalização polêmica

A questão ideológica pôs em segundo plano a questão essencial: a exploração eficiente, segura e lucrativa do pré-sal.

Nenhum governo prejudicou tanto a imagem da Petrobras quanto o atual. As ações da empresa, que é uma sociedade anônima, uma das maiores do mundo, perderam 25% do seu valor de janeiro a esta data. Estão valendo o preço de seis anos atrás. Qual o porquê disso ante as imensas reservas do pré-sal, sem falar no pós-sal? George Soros deu-nos as respostas ao vender suas ações. São as trapalhadas, incertezas e inseguranças em torno da gestão e da capitalização da empresa, que pertence aos acionistas, ora desdenhados pelo acionista controlador, ou seja, a União, representada pelo presidente da República. Vejamos.

Primeiro, a União, controladora da empresa, deve participar de sua capitalização fornecendo-lhe 5 bilhões de barris de petróleo do pré-sal, ativo ainda escondido a milhares de metros de profundidade, noutras palavras, vende à vista o bezerro que supostamente irá nascer, mas não se sabe quando, a que custo e de que jeito. Mas ainda, não há acordo sobre o preço de cada barril. Avaliações encomendadas pela Petrobras e pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) indicaram valores muito diferentes – entre US$ 5 e US$ 6, num caso, e entre US$ 10 e US$ 12, no outro. Se prevalecer um preço considerado alto pelo mercado, os acionistas particulares poderão ser desestimulados, porque será difícil manter sua participação no capital ou, pelo menos, evitar uma redução muito grande. A disputa sobre o valor daqueles barris é um fator de insegurança para os investidores. Além de tornar o quadro muito confuso, o desentendimento reforça o temor do viés político nas decisões sobre o papel da Petrobras: uma empresa competitiva ou usada pelo Estado.

Uma assembleia de acionistas aprovou a emissão de papéis para captação de até US$ 150 bilhões. A operação foi adiada de julho para setembro e já há dúvidas sobre o cumprimento do novo prazo. A questão ideológica pôs em segundo plano a questão essencial: a exploração eficiente, segura e lucrativa da riqueza do pré-sal. Ao ressuscitar bandeiras dos anos 1950, o governo simplesmente desviou o foco do planejamento e dificultou a mobilização de capitais. O articulista Celso Ming tocou no imo da questão: “O interesse da União (e do Tesouro) nesse jogo é obter o preço máximo pelo patrimônio público (5 bilhões de barris) a ser repassado à Petrobras. Do ponto de vista da estatal, pagar menos é apenas um dos objetivos. O mais importante é obter a maior quantidade de recursos em dinheiro para viabilizar os investimentos futuros. O problema é a limitada a capacidade de subscrição do acionista minoritário (68% do capital), o que vai aportar dinheiro vivo. A US$ 5 por barril, o Tesouro teria em espécie o cacife de US$ 25 bilhões, o que exigiria dos minoritários, se todos estivessem dispostos a acompanhar, outros US$ 50 bilhões. Mas a US$ 10 por barril, o Tesouro teria o dobro, teria US$ 50 bilhões, e exigiria outros US$ 100 bilhões dos minoritários, o que seria uma enormidade”.

Corre nos corredores da Bovespa – que representa mesmo o mercado – que o preço justo para os minoritários subscreverem as ações é de US$ 5 o barril. Dizem que Lula adiará ainda mais a capitalização, para depois da eleição; firme no seu esquerdismo a la Marco Aurélio Garcia, o jurássico. Pior para a Petrobras e para o Brasil. Se a subscrição for rejeitada pelos minoritários, a Petrobras corre o risco de não se capitalizar, já que o governo dinheiro não tem, apenas exibe seu nacionalismo retrô. Avelhantados brocardos lusitanos, de imemorial sabedoria, calham à fiveleta a este festival de besteiras que o governo Lula patrocina no processo de capitalização da Petrobras com viés estatizante, em nome do “povo brasileiro”, mesmo daqueles brasileiros que não acionistas são apenas pagadores de gasolinas e diesel e gás, a preços que estão entre os maiores do mundo.

Que venham os ditados. “Quem muito quer, tudo perde”, “quem corre cansa, quem espera alcança”, “mais vale um pássaro na mão do que dois voando”, “bom negócio é o que a todas as partes satisfaz”. Em termos práticos, estão a dizer que o preço do barril será determinado não pela contratação de uma nova certificadora internacional, à conta dos minoritários para dar transparência ao negócio até mesmo em termos internacionais, com renome e nível técnico, o que seria o ideal, mas por um ato político do presidente todo-poderoso. Ficará o preço do barril em US$ 8 o barril. Resta combinar com o mercado. Cadê a seriedade?

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