A marcha do Brasil sob Bolsonaro

Sacha Calmon
Advogado, coordenador da especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e UFRJ

Hoje, temos o número de população ocupada no zero a zero, em comparação com o período pré-pandemia, e o total de horas trabalhadas um pouco acima. O que está puxando para baixo é a renda por hora trabalhada, afirma o economista Daniel Duque, responsável pelo estudo. Assim, o indicador está hoje mais de 8% abaixo do nível do último trimestre de 2019.

“A renda média hoje é afetada bem menos por quem entra e sai [do mercado de trabalho] e mais pelo comportamento da renda daqueles que estão empregados”, continua. “Os empregados estão trabalhando mais horas do que em 2019, mas não estão conseguindo renda com os ajustes nominais que tiveram. Estão empregados, mas perdendo o poder de compra.”

No curto prazo, a perspectiva é que esse cenário de degradação da renda se mantenha. “Devemos ter uma manutenção da situação atual. Estamos vendo uma inflação muito persistente, acima das expectativas. Então, provavelmente, veremos a massa salarial caindo, com mais emprego e menos renda”, diz Duque.

As perspectivas para a economia neste ano não contribuem para a questão da renda. “Havia expectativa de que a inflação daria trégua, mas números mostram que isso não está acontecendo. Além disso, as projeções para a atividade econômica não são boas”, diz. “Há fraco crescimento da economia e inflação em patamares elevados. Quando juntos, esses dois fatores não costumam ser benéficos para a renda. Significam renda se mantendo em patamares baixos ou podendo cair ainda mais miséria e menos gasolina.

A percepção da situação econômica brasileira é de piora no primeiro trimestre de 2022, em relação ao mesmo período de 2021, em 14 das 15 capitais mais o Distrito Federal, para as quais calcula o índice de miséria, construído pela soma da taxa de desemprego e da inflação.

Um indicador elevado significa que a percepção de poder de compra por parte da população piorou. Os dados servem de aproximação para um índice de miséria estadual, segundo o economista-chefe da MB, Sergio Vale. O ranking é liderado por Salvador (BA), Recife (PE), Aracaju(SE) e São Luís (MA). Em todos eles houve piora do índice. A média nacional está em 22,6, também superior ao registrado no primeiro trimestre do ano passado.

A gasolina no Brasil já é a terceira mais cara de uma lista de 29 países mais a zona do euro, após ajuste pelo poder de compra, de acordo com cálculos da Oxford Economics. Ainda assim, os preços domésticos podem ter de subir mais neste ano se a Petrobras resolver trazê-los de volta à paridade com os preços internacionais, estima a consultoria.

Marcos Casarin, economista-chefe para a América Latina, e Felipe Camargo, economista sênior para a região, calculam que o preço de um litro de gasolina comum equivale a 9% do salário médio diário no Brasil, empatando com o Paquistão e vencendo apenas de Filipinas (19%) e Indonésia (13%). O custo do combustível no Brasil é maior que em outros emergentes, como México (7%), Turquia (5%), Chile (3%), África do Sul (2%) e Colômbia (1%).

Agora, o caso dos pastores arrecadadores de fundos de campanha. Depois de muitas pressões, inclusive ameaça de ação judicial, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República divulgou ontem as agendas do presidente Jair Bolsonaro com os pastores. São 35 registros de acesso a gabinetes do Palácio do Planalto emitidos em nome do pastor Arilton Moura, envolvido em suposto esquema de favorecimento para liberação de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), vinculado ao Ministério da Educação.

A relação foi divulgada um dia depois de o próprio Planalto afirmar que não poderia fornecer as informações por questão de segurança. Ontem, entretanto, o governo recuou e alegou que a divulgação “é fruto de recente manifestação da Controladoria-Geral da União quanto à necessidade de atender ao interesse público”. De acordo com documento, há registros de 27 acessos do pastor Arilton Moura a locais do Palácio do Planalto em 2019, um em 2020, cinco em 2021 e dois neste ano. O líder evangélico esteve na Casa Civil, na Secretaria de Governo, no gabinete do vice-presidente Hamilton Mourão e no gabinete que organiza a agenda de Bolsonaro. Na lista divulgada pela pasta, chefiada pelo general Augusto Heleno, há registros também de 10 acessos a gabinetes pelo pastor Gilmar Santos.

Gilmar Santos e Arilton Moura são suspeitos de cobrar propina de prefeitos para facilitar liberação de verbas da educação. Em áudio, o ex-ministro Milton Ribeiro afirma, durante reunião com prefeitos, que repassava verbas para municípios apontados pelos dois evangélicos. Fazia isso a pedido do presidente Jair Bolsonaro. Santos e Moura já foram fotografados em eventos no Palácio do Planalto e em encontro com Bolsonaro no gabinete. Para analistas, trata-se da “caixinha” com dinheiro público para a campanha da reeleição do presidente.

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