O poder, qualquer poder político, detesta ser desmascarado. Criticar até pode mas desvendá-lo jamais! Que diferença há entre os Estados Unidos (EUA) e a China quando tentam bloquear os vazamentos do Google e do Wikileaks, julgando-os contrários aos respectivos “interesses nacionais”? São iguaizinhos. Ao meu sentir, o jornalismo é feito de fatos reais. Os documentos vazados são reais, logo são publicáveis. Não cabe à imprensa deixar-se levar por “interesses nacionais”. Os jornalistas são como os gansos do Capitólio, deitam falações. Durante o macartismo fascista nos EUA, vimos como a coragem solitária de um radialista derrocou o senador que conduzia a inquisição contra a esquerda, perante uma nação de acovardados. Foram dois jornalistas do Washington Post que derrubaram o dúbio e republicano governo Richard Nixon. O mesmo não ocorreu com a guerra ao Iraque. Até o New York Times foi leniente, e todos se deixaram levar por mentiras deslavadas que justificavam, material e moralmente, a invasão do país, no fundo uma aventura grotesca e desumana dos “falcões neocons” e suas propaladas guerras unilaterais, à revelia da Organização das Nações Unidas (ONU), fulminantes e consagradoras do poderio bélico da superpotência, alcolitados pelos interesses econômicos da indústria de armas e do petróleo. O então vice-presidente Dick Cheney, segundo dizem, nunca ganhou tanto dinheiro na vida. Ainda bem que, de fora a derrubada de Saddam Hussein, deu tudo errado. Depois da Segunda Guerra Mundial – com o auxílio descomunal da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) no front oriental – o grande irmão do norte não ganhou uma guerra sequer. Perdeu a do Vietnã, empatou a da Coreia e vai sair do Iraque e do Afeganistão sem vitórias militares significativas e políticas, embora tenha garantido o suprimento de óleo do Iraque (o motivo econômico oculto de Washington).
Quem produz documentos deve saber guardá-los. Ao jornalismo cabe divulgar fatos, por mais inconvenientes que sejam, e resguardar as fontes, sem contar que o poder invasivo e controlador dos governos, antecipado por George Orwel no livro O grande irmão, se torna a cada dia mais opressivo. Dito cenário infunde à missão do Wikileaks induvidosa utilidade. Visa à preservação dos indivíduos, a sua liberdade à informação para lá das aparências. Leaks em inglês significa vazamento. Wiki Wiki é a palavra de nativos do Havaí e significa “rápido, bem rápido”. O site não é de fofocas, mas de divulgação de opiniões e propósitos secretos. Disponibilizei o meu para receber o Wikileaks, em prol da verdade e contra as investidas dos poderosos deste mundo. Abaixo o maniqueísmo. Não existe batalha alguma entre o bem e o mal, mas entre nações e seus interesses, entre corporações e suas ambições, entre concepções políticas, éticas e religiosas diferentes. Em vez de vítimas, os indivíduos, as pessoas, deveriam arbitrar as querelas mundiais e gritar bem alto os seus interesses próprios em resguardo da segurança, da paz e da liberdade, em escala global, denunciando todas as mentiras, desculpas e horrores dos poderes estabelecidos, de leste a oeste, de norte a sul.
Quanto a isso, o Wikileaks singra no rumo certo em mares habitados por ferozes feras. Que a sua rota prossiga a velas pandas. O mundo moderno lida com duas realidades: o poder político dos Estados nacionais e a emergência das liberdades individuais nas sociedades civis. Hoje existem organizações não governamentais (ONGs) que fiscalizam ONGs (de araque). No Brasil, a Contas Abertas nos informa semanalmente dos descalabros da corrupção, tanto quanto o Tribunal de Contas da União (TCU valoroso órgão auxiliar de um Legislativo omisso e permissivo, tanto que se vale de organização não governamentais de fachada para desviar recursos públicos.
Devemos criar órgãos não governamentais capazes de atuar bem na cena política. A democracia representativa é a melhor forma de governo que conseguimos idealizar. Mas não é suficiente. A sociedade civil pode e deve fiscalizar os governos (Executivo, Legislativo e Judiciário). Quem sabe não será esse o novo paradigma do século 21? Em vez de governos que tudo podem, usando mentiras, com o auxílio dos meios de comunicação bem comportados, uma efervescência civil mundial que pouco a pouco globaliza os problemas e as soluções. A problematização dos fatos inquietantes e as soluções – cito o fator climático – há muito deixou de ser uma questão de soberania nacional para tornar-se assunto de sobrevivência da humanidade. Nos EUA, o Partido Republicano, principalmente ele, não crê em aquecimento global! Nem eu nem o Bianor conseguimos entender esses façanhudos. Em Cancún, um deputado democrata disse que o aquecimento global não consta da Bíblia. Só a pressão inteligente dilui gente dessa laia.
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