A tolerância religiosa e a ausência em conflitos políticos bélicos contra países muçulmanos nos imunizam contra atos terroristas
Não sei até que ponto o leitor conhece meus livros (não os jurídicos) Breve história do mal, de filosofia moral, e A história da mitologia judaico-cristã, de história das religiões (sociologia). Pelo blog do Sacha, é possível adquiri-los ou na Livraria Quixote. Está no prelo, ainda, a Invenção do monoteísmo, trabalho escudado em arqueólogos e historiadores etnicamente judeus, para não ser acusado pelos leigos de adentrar terrenos religiosos. Ocorre que tenho formação também nessas áreas, desconhecidas pela quase totalidade de nossa sociedade. Ao contrário, trabalho conceitos culturais e religiosos, com isenção, cientificamente, dispensável dizer que sou arreligioso (o que é diferente de ser antirreligioso).
Humanista, não me dou à desfaçatez de ser islamofóbico ou xenófobo, duas atitudes imbecis que tomarão corpo, inclusive no Brasil. Nesse ponto, somos um país livre de preconceitos religiosos, a não ser resquícios primários contra a umbanda, tida por muitos como feitiçaria negra e de negros. De qualquer modo, somos uma democracia religiosa exemplar. Aqui não ocorrem conflitos religiosos e sectarismos e, por isso, jamais teremos atos terroristas. A tolerância religiosa e a ausência em conflitos políticos bélicos contra países muçulmanos nos imunizam contra atos terroristas. O terror é uma tática tão antiga quanto as guerras. No Vietnã, os americanos tinham pavor de ser capturados pelos vietcongues e as “cruzadas”, algumas, por onde passavam, massacravam as populações civis islamitas e saqueavam cidades e vilas, em nome de Cristo contra os “infiéis”, aterrorizando-os. O IRA irlandês e o ETA basco existiram antes do jihad radical.
Riscos correm delegações de países. Americanos, franceses, ingleses, australianos, israelitas e russos durante as olimpíadas podem nos dar trabalho para protegê-los. O Brasil pode atrair atentados porque nossa atual administração é péssima. Mas, pela simpatia que desperta, desencoraja atitudes terroristas em seu território. Por serem malquistos os visitantes, é melhor prevenir do que remediar. Não queremos massacres, já temos crises outras, a ética, a política, a econômica e a social, com o desemprego tomando corpo, punindo os estamentos mais necessitados de nossa sociedade.
Felizmente, entre intelectuais e políticos americanos, russos e alemães, começa a ganhar corpo a tese de que uma guerra de civilizações, impulsionada pela “direita” de todos os países ocidentais, é idiotice sem tamanho, sobre ser perigosa, fazendo-se necessário um renascimento dos antigos laços entre as religiões reveladas, paz ampla e cooperação econômica.
Para começar, o cristianismo e o islamismo são religiões derivadas do judaísmo e, por isso, são chamadas de “abraâmicas”. O Deus judaico Javé é o “pai” do Deus-filho cristão. É o mesmo Eli de Jesus (no aramaico falado por ele na região de Aram-Damasco) ou o Alá dos islamitas. Jeová e Alá são um só e mesmo Deus.
É preciso distinguir entre grupos terroristas, todos sunitas (nenhum é xiita), como Al-Qaeda, Al-Shabab, Al-Nusra, Talibã, EI, Boko Haram, salafitas, do islã pacífico das mesquitas, cujos clérigos pregam a paz, o perdão e a misericórdia como os padres cristãos, os pastores e os rabinos. Dizem alguns que o islã é incompatível com a democracia. A França católica tem algum apreço por essa ideia, mas, nas mesquitas da França, em 98% delas – em que também existem líderes espirituais engajados –, as orações eram pelas vítimas do terror tal qual nas igrejas. Veja-se a Turquia, onde 90% da população é mulçumana. A separação entre a Igreja e o Estado é cláusula pétrea na Constituição turca. O Estado é laico. As mulheres, desde 1934, obtiveram o direito de votar, antes de muitos países ocidentais. Traje religioso é questão de foro íntimo e a liberdade de crer ou não crer, direito público subjetivo. No Irã, 60% da população universitária é de mulheres, e no Egito 5% da população é ateia.
Não podemos confundir grupos radicais, sejam muçulmanos ou ocidentais, como o Baader-Meinhof, as brigadas vermelhas, o EI, o Boko Haram, com as sociedades humanas e as religiões que seus membros praticam.
Portanto, o mundo muçulmano, que engloba persas (Irã e curdos), turcos (Turquia e repúblicas do Sul da Rússia), indonésios (300 milhões), negros (mais de 200 milhões), indianos, pashtuns, malaios, árabes e berberes do Norte da África, além dos povos europeus dos Bálcãs e comunidades instaladas na Europa ocidental (55 milhões), juntamente com o Ocidente, precisam urgentemente se associarem num amplo movimento de cooperação econômica, para criar um contramovimento dos grupos radicais jihadistas, em função da leitura radical do Corão originada, justamente, em Meca e Medina (Arábia Saudita). Tempos idos e vividos. Que haja paz entre os crentes. Matar ou ser morto em nome de Deus é um paradoxo inaceitável.
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