O governo está há fazer uma Reforma Tributária (que observe as técnicas próprias).
A hipótese de incidência da norma tributária é formada pela integração de várias leis ou artigos de lei que tratam, ao nível do Direito Positivo, de fatos que devem (ou não devem) dar origem, quando ocorrentes, a obrigações tributárias. No plano mais amplo da “esquematização jurídica do mundo fático”, os fatos são selecionados pelo legislador tributário segundo o critério de que uns são irrelevantes, e outros relevantes para gerar tributação.
Alfredo Augusto Becker observa que: “Não existe uma regra jurídica para a hipótese de incidência, outra para a base de cálculo, outra para a alíquota, etc. Tudo isto integra a estrutura lógica de uma única regra jurídica resultante de diversas leis ou artigos de leis (fórmula legislativa literal). É preciso não confundir regra jurídica com lei; a regra jurídica é uma resultante da totalidade do sistema jurídico formado pelas leis.” (grifos nossos).
Kelsen, no mesmo sendeiro, já asseverava na Teoria Geral do Direito e do Estado que as normas eram diversas das “regras” (juízos hipotéticos). Note-se que o mestre austríaco considerava as “normas” como “defluentes” das leis.
Tanto Kelsen quanto Becker utilizam os termos regra e norma de modo polissêmico. Ora regra é lei, ora é até mesmo a “proposição descritiva” da norma. Note-se na cita de Becker, retro, a palavra regra significando norma e lei, a poucos centímetros uma da outra…
A norma jurídica surge da proposição da ciência que descreve o direito, sob a forma de juízo hipotético desvendando a lei, que é a “fórmula legislativa literal” através da qual, por um ato de vontade, o direito é posto, vige e vale. A norma jurídica é o “ser” jurídico por excelência e tem formulação prescritiva. O jurista é o “sujeito cognoscente” que, debruçado sobre o “objeto do seu conhecer” – o mundo do Direito –, desvenda o seu íntimo significado, extraindo do “ser” o “dever-ser”. Uma questão gnosiológica.
Pois bem, a hipótese de incidência das normas tributárias, o que contem são fatos tributáveis. A previsão legal desses fatos é feita pelo legislador de duas formas: a) em certas leis ou artigos de lei – entes de direito – prevê que dados fatos são aptos a gerar, quando ocorrentes, obrigações tributárias; b) noutras leis ou artigos de lei prevê expressamente que certos fatos, tipos de fatos ou aspectos factuais não são “jurígenos” no sentido positivo, isto é, não são aptos a gerar, quando ocorram, obrigações tributárias. Vale dizer, através das leis o legislador “qualifica” os fatos e os reparte, atribuindo a uns efeitos impositivos e a outros, efeitos exonerativos, segundo os seus desígnios. A saída de mercadorias do estabelecimento industrial, comercial ou produtor é “fato gerador” do ICMS. Todavia, quando saírem para o exterior, tal fato já não mais é “gerador”, tendo em vista regra imunizante expressa para os industrializados e regra isencional expressa para as demais mercadorias (LC nº 87/96).
O legislador só pode dizer que dado fato ou aspecto factual não é tributável através de lei (princípio da legalidade). Se usar a lei constitucional, trata-se de imunidade, e se utilizar a lei infraconstitucional, cuida da isenção.
A doutrina, em peso, posiciona a imunidade no capítulo da competência. Pontes de Miranda preleciona: “A regra jurídica de imunidade é regra jurídica no plano da competência dos poderes públicos – obsta à atividade legislativa impositiva, retira ao corpo que cria impostos qualquer competência para pôr, na espécie.”
Bernardo Ribeiro de Moraes secunda-o: “Cabe à Carta Magna estabelecer a competência dos poderes tributantes. Da mesma forma, cabe-lhe limitá-la, podendo, na entrega do poder impositivo, reduzir a competência tributária pela exclusão de certas pessoas, atos ou coisas, colocados fora da tributação.”
Aliomar Baleeiro, insigne e saudoso mestre, não discrepa: “As limitações constitucionais ao poder de tributar funcionam por meio de imunidades fiscais, isto é, disposições da Lei Maior que vedam ao legislador ordinário decretar impostos sobre certas pessoas, matérias ou fatos, enfim situações que define.”
Ataliba aduz que “imunidade é ontologicamente constitucional” e que “só a soberana Assembleia Constituinte pode estabelecer limitações e condições do exercício do poder tributário.”
Ulhôa Canto reforça-o com dizer que: “Imunidade é a impossibilidade de incidência que decorre de uma proibição imanente, porque constitucional… Portanto é tipicamente uma limitação à competência tributária que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios sofrem por força da Carta Magna, porque os setores a eles reservados na partilha de competência impositiva já lhes são confiados com exclusão desses fatos, atos ou pessoas.”
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