O grande entrave é a autorização de 2/3 do Congresso para iniciar o processo de impedimento, segundo penso. Uma questão de conveniência e oportunidade.
Houve um caso em Minas, quando da liquidação extrajudicial do Banco Agrimisa pelo Banco Central (BC). Este banco fez um mútuo a uma empresa do Grupo Rural no valor de US$ 10 milhões em Belo Horizonte. O Banco Rural, em sua agência em Salvador, a seu turno, emprestou ao grupo controlador do Agrimisa o mesmo valor, com a mesma taxa de juros e mesmo dia de vencimento. Tratava-se de uma “operação cruzada” envolvendo dois bancos e duas “empresas ligadas” a eles, o que é proibido pela legislação do BC (até a presente data). Na verdade, o Agrimisa estaria “emprestando” US$ 10 milhões a uma empresa do Banco Rural e este outro tanto ao grupo controlador do Agrimisa. Operações reais, simulando negócios lícitos entre empresas diversas, mas, juridicamente, volteando a lei para ocultar “financiamentos” desses bancos às empresas dos seus grupos. Mais tarde, o caso resolveu-se e houve a conversão da liquidação do Agrimisa em ordinária.
Ante os papéis bisonhos da AGU, do BC e do Ministério da Justiça, que negam ter o Banco do Brasil (BB), a Caixa Econômica Federal (CEF) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) “emprestado” dinheiro ao Tesouro para fechar as contas deficitárias do governo, detectadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que é órgão de fiscalização, a serviço do Poder Legislativo (Constituição Federal, artigo 71), veio a calhar a lembrança desse caso. O que significa o negócio jurídico do mútuo senão a entrega atual de certo montante monetário, a prazo, vencendo juros e com dia certo no futuro de retorno do principal? O que é uma operação de crédito se não tomar dinheiro à vista ou quando for preciso, de terceiros, com a obrigação de devolvê-lo com juros e demais deveres acessórios?
A legislação brasileira está de acordo com a legislação internacional, que juramos respeitar quando assinamos o Tratado Bancário Internacional nesste sentido. Diz ainda com transparência e se coaduna com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) a obrigar União, estados e municípios a não se endividarem “indiretamente” mediante transações bancárias além dos limites previstos na lei de diretrizes orçamentárias, sejam os bancos controlados ou não pelos governos. Qual a razão? Obrigar os governantes a não extrapolarem os limites orçamentários (seriedade e responsabilidade na administração da coisa pública). Caso contrário, que se volte ao tempo da “conta movimento” do BB, que era um saco sem fundo à disposição do governo federal. E que voltem os bancos oficiais a fornecer dinheiro graciosamente aos seus controladores. A LRF, ao lado da estabilização do real, além da privatização das teles e das siderúrgicas, que só davam prejuízos e hoje lucram, são os grandes feitos de FHC. A preservação dessas conquistas é imperiosa.
Ao não cumprir o superávit primário, obrigando o Congresso Nacional a alterar o Orçamento no final do exercício, o governo Dilma cometeu “crime de responsabilidade”. Ao tomar R$ 40 bilhões da CEF, do BC e do BNDES, instituições bancárias sob seu controle, para “maquiar” suas contas “que não fechavam”, mais uma vez Dilma cometeu, pela segunda vez, grave crime de responsabilidade, capaz de levá-la ao impeachment. Há ainda um terceiro fato, sabido, mas ainda não imputado, que a faz ré de crime de responsabilidade. Violou a competência exclusiva do Congresso ao financiar sem a sua autorização o Porto de Mariel, em Cuba. Artigo 49 da CF: “É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I – resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”. Artigo 85 da CF: “São crimes de responsabilidade os atos do presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: II – o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos poderes constitucionais das unidades da Federação; V – a probidade na administração; VI – a lei orçamentária; VII – o cumprimento das leis e das decisões judiciais”.
Que a nação é leniente, como país latino-americano que somos, compreende-se. O que se não entende é o senhor FHC dizer “que há um fato objetivo ou não há”. Estou convidando-o a explicar à nação para fins de impeachment, nos termos da Constituição, o que é, ao fim e ao cabo, o seu enigmático “fato objetivo”. Estamos fartos de meias palavras e de panos quentes. Curvo-me aos seus cabelos brancos, embora os tenha igualmente. Sua palavra vale mais. O grande entrave é a autorização de 2/3 do Congresso para iniciar o processo de impedimento, segundo penso. Uma questão de conveniência e oportunidade. Questão política, jamais uma questão jurídica ou constitucional.
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