Coitado do Queiroga

O ministro não tem que pedir, mas exigir recursos e meios ou então sair

 

Sempre me impressionou a capacidade de pessoas abnegadas em momentos de guerra ou crises humanitárias agudas, como as da Síria e agora a que começa a se delinear no Brasil, em prejuízo dos mais pobres, mas sem poupar os ricos, salvo os que já foram para a Ásia e o Chile nos seus jatos.

Aqui, pela indolência, ignorância e falta de empatia do grã-vizir, o país se tornou o epicentro mundial da epidemia. Nas Américas, diante da maior circulação dos brasileiros, o medo é intenso.

No Brasil, além da deficiente governança, falta tudo: vacinas, escamoteadas por uma escala oficial de vacinação que terminará em 2024…, leitos, respiradores, oxigênio, intubação simples (no leito mesmo), sedativos, vasodilatadores pulmonares, aspirina, e principalmente pessoal treinado. E o governo não faz nada. E o presidente diz que os prefeitos e governadores não o deixaram fazer nada, desculpa com as calças arriadas. (A botar a culpa nos esforçados governadores e prefeitos. Chega a ser cinismo e falsidade.)

Presidente de fala ao vento, considerado pela OMS o pior gestor nacional da epidemia, por país, está em cinquentagésimo quarto lugar, abaixo de Gana, Senegal e Moçambique, na classificação geral.

Ainda ao tempo de Trump, para quem baixou as calças, em sentido figurado, obviamente, ficou a discutir com a Pfizer o preço de compra das vacinas. Comprou-as agora pelo triplo do preço daquela época. Trump se negou, óbvio, a interferir.

Quando o surto começou – a Ásia foi menos atingida, China, Vietnã, Laos, Camboja etc. –, o mundo olhou o Oriente como um lugar distante. Disso o vírus se aproveitou e ganhou EUA, Europa e América Latina num piscar de olhos. O trânsito humano no mundo moderno é intenso.

Em dezembro do ano 2019, a China relatou à OMS uma gripe pneumônica resistente em humanos, numa província do centro-norte (Wuhan) e imediatamente a isolou. Construiu quatro imensos hospitais em dois meses. O resultado é simples. É o país mais populoso do mundo e está em 34º lugar em exposição à pandemia. Cinco mil anos de civilização – numa hora tão dramática – fizeram a diferença, sem falar na governança, com uma capilaridade de 100 milhões de agentes públicos passivos que entram em ação em 72 horas. É de tirar o chapéu.

Mas voltemos ao Queiroga, o novo ministro. Tomara que comova o Executivo e o Legislativo, onde Lira e o mineiro Rodrigo Pacheco não são “paus mandados” e certamente agirão com decisão para convocar os corpos de saúde e funcionários aposentados, além de treinados, para deter a espiral ascendente da pandemia no Brasil.

O ministro não tem que pedir, mas exigir recursos e meios ou então sair, pois três já vieram e saíram por falta de meios ou por se negar a aplicar a tal da hidroxicloroquina, remédio para gado e auxiliar no tratamento da malária.

É preciso, ademais, reunir o SUS aos demais serviços de saúde, inclusive privados, para ganharmos a guerra.

A situação brasileira é muito pior do que – quem diria – a da Venezuela e demais países sul-americanos, exceto o Peru, que se nos iguala.

Relatório bem-feito fê-lo Luiz Carlos Azevedo, com a sua costumeira competência. Vamos ver o que disse: “Em São Paulo, o estado com mais recursos, maior rede hospitalar e principal produtor de vacinas do país, a situação é dramática, com uma morte a cada dois minutos. Maceió suspendeu a vacinação programada para ontem. Em Belford Roxo (RJ), milhares de pessoas se aglomeraram nos postos de vacinação sem conseguir se imunizar, todos idosos. Até agora, o Brasil vacinou cerca de 10 milhões de pessoas, que equivale a 4,7% da população. É muito pouco, porque a chamada P1, originária de Manaus, já se espalhou por todo o país. Esse vírus mutante é responsável pelo novo perfil da pandemia, com taxa de contaminação mais alta e letalidade maior. Também está hospitalizando pacientes mais jovens por longo tempo”.

Nessa escalada, “será inevitável um lockdown em muitas cidades, pois 90% dos leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) para COVID-19 estão ocupados. O índice considera hospitais públicos e particulares. Na Grande São Paulo, a taxa média é ainda maior, 90,6%. Em todo o estado, 69 cidades já alcançaram 100% de ocupação de leitos de UTI. São 24.992 pessoas internadas, sendo 10.756 em UTIs e 14.236 em enfermaria”.

Mas não é só isso. As vacinas acabaram. Agora temos que nos virar com a lenta produção do Instituto Osvaldo Cruz (que produz outras vacinas e não pode pará-las) e com o Butantan, do governo de São Paulo, cuja produção é muito maior.

A situação é grave, segundo Azevedo. Quanta diferença de Biden nos EUA, que vacinará todos até maio, e da Ásia, hoje o lugar em que o mundo cresce e inova, afora os EUA.

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