A história pode ser fascinante, mas nos recorda, sempre, vastos horrores
A civilização ocidental tem valores sadios que se tornaram universais ao longo dos 2 mil anos que nos precederam. É comum aos nossos leitores as expressões “civilização greco-romana” e “tradição judaico-cristã”. O cristianismo é uma variante do messianismo judaico, que desde 64 a.C. esperava um messias salvador, filho de Javé, que tornaria Israel o centro do mundo.
Com efeito, os filósofos gregos, a incrível expansão de uma cidade (Roma) num império extraordinário, único na história da humanidade, pelo imenso tempo de sua duração, e a sua adoção por Constantino, um imperador romano, por volta dos anos 300 d.C., das seitas escoradas nos ensinamentos de Jesus, em Niceia, impulsionaram o cristianismo por toda a bacia do Mar Mediterrâneo, mormente no Oriente Próximo e toda a Europa, desde Constantinopla (hoje Istambul).
A partir de 325 d.C., como relata Eusébio da Cesarea, o imperador romano oficia – ofuscando as divindades greco-romanas – as posições do cristianismo. Claro que houve divergências, como a dos donatistas e dos arianos, que negavam a divindade de Jesus.
O que não se costuma dizer, de caso pensado, é que o arianismo (por causa de Ário, seu propagador) é que tendo Jesus morrido, era o filho humano dileto de Deus, mas obviamente não era o próprio Deus, esse que nunca teve princípio e jamais terá fim, o que, ao meu sentir, é um raciocínio válido. A trindade: Espírito Santo, o pai e o filho numa só pessoa é irracional. (É dogma por isso.) Constantino, no fundo, era um arianista, apesar da incipiente trindade, em prol de Cristo, o crucificado, visando acalmar os pobres dos seus imensos domínios, incluindo os futuros coptas do Egito, potência regional no Norte da África.
Instalaram-se mil controvérsias e seitas, ao mesmo tempo em que se erguiam templos inclusive em Roma (no lugar que mais tarde viria a ser a basílica do Vaticano). Foi preciso que o imperador Teodósio convocasse o Concílio de Constantinopla para construir a vitória dos católicos sobre os arianos (anatematizados). Católico significa universal no grego antigo, língua culta na época.
Essa vitória foi feita à força, entremostrando a onipresente energia da Roma antiga, o maior império jamais visto, antes ou depois dos dias que correm (o Império Britânico durou 100 anos, convivendo com outros, e a supremacia americana surge em 1950, no pós-2ª Guerra Mundial).
Retornando ao tema, Teodósio promulga o édito de Tessalônica, declara a vitória dos católicos, reprime as demais seitas cristãs e torna o cristianismo único, que se dissolvia em controvérsias, a religião oficial do Império Romano, agora dividido em dois – o do Ocidente, sediado em Roma, e do Oriente, sediado em Constantinopla, com uma acuidade política fenomenal, já que Roma sofria constante assédio das tribos germânicas para lá do Danúbio, que assolavam a Europa e a invadiram, como aconteceu sob o comando de Alarico.
Ao contrário, o cristianismo e o Império Romano oriental duraram em Constantinopla até 1452, quando foi conquistada pelos turcos otomanos de fé islâmica (Maomé veio 650 anos depois de Cristo).
Enquanto isso, Roma cai, mas se ergue, torna-se a um só tempo uma cidade com muralhas e domínios territoriais na Itália. É sede do cristianismo católico (universal). Logra converter com seus monges e evangelizadores todos os povos do Ocidente europeu que lá se estabeleceram sobre os celtas (alanos, borguinhões, godos, ostrógodos, visigodos, vândalos suevos, etc).
Mas os mais importantes fatos são a um só tempo o estudo dos filósofos gregos (Santo Agostinho por exemplo) e a aliança com o governante mais forte da Europa germanizada pelas chamadas “invasões bárbaras”! Dom Remígio diz a Clóvis: “Queima os deuses que adorastes e crê no Deus, cujas imagens queimastes”. Logo mais, Carlos Magno, rei dos francos no território que hoje abrange o Sul da Alemanha e toda a Gália (França), torna-se o imperador do Sacro Império Romano do Ocidente.
Eis como política e religião se entrelaçam nos caminhos da história. Contudo, mais à frente outra grande revolução ocorrerá num país cristianizado, onde os nobres mandavam e os pobres sofriam, sem que tenha ocorrido uma revolução sangrenta como a francesa. É a revolução industrial, com uma terrível exploração da mão de obra sobrante e o aparecimento das máquinas, primeiramente das têxteis, na pérfida Albion (Inglaterra).
A face do mundo muda por inteiro e deixa para trás a recuperação da cultura clássica greco-romana ao tempo do Renascimento (etapa histórica europeia). Está iniciado o capitalismo, na mesma esteira do colonialismo mundial, do imperialismo, das guerras cruentas. (Vencida já a Idade Média ou a Era das trevas.) Nunca tanta violência sacudiu a humanidade como na evolução do capitalismo (séculos 19 e 20).
Em Roma, o papa rege o cristianismo com a mesma pompa dos Césares, apesar das reformas protestantes e contrarreformas. A história pode ser fascinante, mas nos recorda, sempre, vastos horrores.
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