Assim como a guerra é importante demais para ficar nas mãos dos marechais, a tributação também o é para ficar exclusivamente nas mãos de congressistas.
Tomam corpo no Congresso duas tendências políticas inaceitáveis: a lista fechada e o voto distrital misto, este impossível de ser implantado no Brasil, por várias razões (ver www.blogdosacha.com.br). A propósito, à semelhança da Lei da Ficha Limpa, façamos a reforma política por iniciativa popular (associe-se ao www.reformapolitica.org.br).
A lista fechada, como o nome indica, não oferece candidatos, contém um grupo de pessoas adrede escolhidas pelas chefias oligárquicas dos partidos. É a sopa no mel. O voto distrital misto, induvidosamente, tende a prestigiar o mandonismo local e os cabos eleitorais profissionais. O distrito, no interior, e haja interior, é como curral. Fica fácil encurralar os eleitores humildes. Muita gente boa, a começar pela editoria de uma grande revista semanal, não se sabe se de boa-fé ou por ingenuidade, vê no distrito eleitoral avanço significativo, laborando em sério equívoco. Por isso mesmo, precisamos nos organizar à volta do link já mencionado. O financiamento público de campanha é uma ideia generosa, porém, caríssima, sem contar que não obstará o financiamento privado escuso, a menos que esse se torne delito penal inafiançável. É dizer: vira crime e dá “cana”. A imunidade parlamentar nem sequer foi tocada até a presente data. Há muito pó de arroz nessa reforma, como é o caso da suplência de senadores. Ninguém quer proibir coligações num país de 28 partidos (a maioria é formada por vergonhosas siglas de aluguel), a gerar um multipartidarismo fisiológico e inorgânico, simulacro de democracia, reduzida ao tempo das eleições. É justamente o presidencialismo hipertrofiado, a comandar coalizões heterogêneas no Congresso, que realça o personalismo presidencial e o fisiologismo partidário, ávido por verbas e cargos. O presidencialismo de coalizão, com reflexo nos Estados, torna o exercício democrático no Brasil opaco e não confiável. Pensando bem, somos um caso à parte, a merecer estudos (o mensalão foi cevado nesse sistema).
A reforma tributária exige algumas medidas prévias. A Fazenda deve ser condenada em honorários de sucumbência pelas suas aventuras judiciais e multada pelos recursos em matérias vencidas, sem que os procuradores sejam responsabilizados pelas chefias. Setenta e dois por cento dos recursos em Brasília envolvem União, estados (São Paulo à frente), municípios e autarquias. São os maiores litigantes do país e o são impunemente, a ponto de o presidente do Supremo querer reduzir o contencioso judicial às duas instâncias que lidam com matérias de fato, não, porém, com as questões de direito (STJ e STF), em prejuízo da Justiça e do devido processo legal. Deveria, com todo o respeito, impedir as pessoas políticas de recursar contra a jurisprudência assente ou por pirronia. O Estado-administração é o culpado pelo infarto do Estado-jurisdição; serve-se dele, usa-o e dele abusa sem resposta. Devem os justos pagar pelas culpas da administração? Ponto importante é o confisco que se opera no chamado lucro imobiliário, ou seja, o ganho de capital que supostamente o proprietário aufere quando, ao cabo de lustrosos anos, apura-se o imposto de 15% entre o preço histórico de aquisição e o preço real de venda, sem o expurgo da inflação. A Fazenda Federal raia ao cinismo quando diz que não corrige o preço histórico de aquisição porque fazê-lo significaria voltar com a correção monetária (agente de inflação). O deboche merece risos. Por acaso as dívidas fiscais não são corrigidas pela Selic diária? Além dos pontos mencionados pela presidente Dilma, esses e outros merecem ser objeto das deliberações congressuais. As entidades de classe, a universidade, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) devem ser ouvidas. Tributos são importantes demais. Assim como a guerra é importante para ficar nas mãos dos marechais, a tributação também o é para ficar exclusivamente nas mãos de congressistas. Há temas ocultos.
A substituição para a frente, com base em pautas prefixadas pelo Supremo, não pode passar em branco. Hoje o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de quase todas as mercadorias é cobrado na primeira operação. As demais, até o consumidor, são presumidas. Exemplifico com um remédio qualquer. A fábrica paga por si, pelo distribuidor, pela farmácia. Às vezes, a base de cálculo final é fixada em R$ 100, mas a farmácia vende por R$ 70. Não tem direito de repetir o indébito. É confisco proibido pela Constituição. Isso não se encerra nos tribunais de segunda instância. Existirá controle de constitucionalidade que obste com efeito suspensivo a lesão a direito? Essas e outras questões, como a glosa de créditos fiscais, manu militari, em razão de incentivos concedidos por outro estado, violentam o direito. A ministra Ellen Gracie (do STF), nesse caso, já concedeu liminar suspensiva da glosa. Duas instâncias, de fato, não bastam. Não é a solução.
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