Sacha Calmon
Advogado, coordenador da especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e UFRJ
Vitor Vasquez e Henrique Curi descrevem a decadência do PSDB, por inércia! Em 23 de maio, João Doria, ex-governador de São Paulo pelo PSDB, abdicou de sua pré-candidatura à Presidência da República. Selecionado nas prévias do partido, Doria justificou sua decisão afirmando não ser a escolha predileta da cúpula peessedebista. Atrelados à desistência encontram-se o seu mau desempenho em pesquisas eleitorais, o pouco apelo que possui fora de São Paulo, a sua alta rejeição e as desavenças com outras elites tucanas. O cenário que se desenha para o PSDB é uma aliança com o MDB, firmando uma chapa encabeçada pela senadora Simone Tebet (MDB-MS) e oferecendo o candidato a vice-presidente, o ex-governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, principal rival de Doria nas prévias do partido.
Se isso ocorrer, será a primeira vez que o PSDB não apresentará um candidato para a Presidência, consolidando a falta de protagonismo do partido nas eleições nacionais. Seria a confirmação factual do que ocorrera simbolicamente em 2018, quando seu então candidato, Geraldo Alckmin, conquistou apenas 4,76% dos votos no primeiro turno. O evento terá pouco impacto sobre o resultado da eleição que se avizinha, pelo menos considerando pesquisas recentes que indicam de 3% a 5% de intenção de voto para Doria. Porém, de forma mais ampla, a ausência de uma candidatura tucana na disputa presidencial ratifica que parte significativa do eleitorado brasileiro segue aberta a uma sigla que a represente.
Fundado em 1988, o PSDB lançou candidatos para presidente desde 1989 e, entre 1994 e 2014, foi no mínimo o segundo colocado na disputa para presidente, sendo o vencedor de duas eleições. A ascensão foi meteórica. Já em 1994, elegeu Fernando Henrique Cardoso presidente. Contudo, tal histórico não foi suficiente para que a sigla fidelizasse eleitores em longo prazo, o que se confirma com pesquisas de preferência partidária realizadas pelo Datafolha a menos de um ano das eleições presidenciais.
Enquanto seu principal adversário, o PT, apresenta identificação partidária média de 18,1% nestas pesquisas, a média do PSDB é de 3,9%. Considerando a última pesquisa realizada em dezembro de 2021, 27,6% dos respondentes preferiram o PT dentre todos os partidos, e apenas 1,9% preferiram o PSDB. Como a maioria dos entrevistados declarou não se identificar com nenhum partido em todas as pesquisas, chama atenção que o PSDB não tenha sido capaz de rivalizar com o PT.
Aspectos organizativos e ideológicos ajudam a explicar tal incapacidade. O PSDB é internamente dividido, como demonstram as últimas prévias e a falta de apoio da sua elite a Doria. Isto dificulta um planejamento político nacional. Além disso, falta ao partido uma identidade ideológica de centro democrático.
Parte de seus quadros se posiciona cada vez mais à direita, inclusive flertando com o bolsonarismo. Na Câmara, parcela significativa de seus deputados apoiou pautas mais conservadoras, como o projeto de “homeschooling”, o PL da Grilagem e a PEC dos Precatórios. Houve adesão de 53,8% de sua bancada à PEC do voto impresso, mesmo com orientação contrária do líder. Nas últimas eleições estaduais, Doria e Eduardo Leite declararam apoio a Bolsonaro no segundo turno e, agora em 2022, Eduardo Riedel, pré-candidato ao governo do Mato Grosso do Sul, estado que encerra a lista de onde o PSDB elegeu governador em 2018, é aliado político do atual presidente…
Nesse cenário, a desistência de Doria significa que, atualmente, uma parcela dos eleitores brasileiros, particularmente aquela posicionada à centro-direita, segue sem referência partidária nacional, permanecendo disposta a preferências circunstanciais. Um horror!
Entretanto bastaria um Covas ou um FHC por renascer. Contudo já não vemos vultos políticos no PSDB como Covas, como Fernando Henrique Cardoso, como José Serra. Era uma sigla respeitada, democrática, de centro e de centro-esquerda e, portanto, capaz de aglutinar a terceira via.
Doria tinha muito o que mostrar inclusive no campo social. Se chegasse a ter 18% dos votos válidos, seria cobiçado para integrar qualquer governo que saísse das eleições de outubro/22. Cometeu-se um erro histórico.
Não temos como noutros países um cenário partidário solidificado, de fora parte o PT, que é de centro-esquerda, com cheiro de povo. Bolsonaro conseguiu aglutinar a direita mormente na classe média onde estão 75% dos seus apoiadores e tentou golpear a democracia justo num 7 de Setembro, mas não teve apoio das Forças Armadas.
Diante do fracasso, rapidamente aliou-se ao centrão, a parte mais tradicional da política brasileira, tão combatida por ele.
O que dizer desse caudilho tão sedento de poder, diante da grande dianteira de Lula, capaz até de ganhar já no primeiro turno?
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