Concedo que há muito preconceito no Brasil. A palavra diz tudo: pré-conceito. Antes de haver racionalidade conceitual, por uma marca emocional ou outra, por pura idiossincrasia, surge o preconceito. Há preconceito quanto a judeus (todo tipo de estereótipo vem a calhar). Vem de longe, dos jesuítas e da cultura católica. Há preconceito contra pobres, maçons, pretos, nordestinos, suburbanos, gays, mulheres, islamitas, e por aí vai. No campo econômico duas classes são malditas: usineiros e banqueiros. Nesses se pode baixar o pau sem dó nem piedade. Nem por isso, com racionalidade, é vedado falar contra eles. É claro que a formação dos juros secundários depende de múltiplos fatores, entre eles o custo da capitação, os riscos, os depósitos compulsórios ordenados pelo Banco Central (BC), os financiamentos forçados, os índices de inadimplência, as despesas operacionais, etc.
Entretanto, o spread, ou a diferença entre o que o banco paga para ficar com o seu dinheiro rendendo (os depósitos são lastros gratuitos) e o que o ele cobra de quem lhe pede emprestado, é no Brasil, simplesmente, o mais elevado do mundo. Como o risco Brasil é nenhum e o governo paga regiamente os bancos para rolar a sua elevada dívida pública, Dilma desafiou-os a provar duas coisas: a primeira, explicar por que os juros bancários brasileiros (o mix todo) são os maiores do mundo; a segunda, declarar qual porcentual dentro do spread corresponde à margem de lucro previamente estabelecida.
Até agora a Federação Brasileira de bancos (Febraban) não se pronunciou, dizendo apenas que qualquer governo pode levar cavalos até a beira do rio, mas não pode obrigá-los a beber água. Eu, sinceramente, não entendi a metáfora. Cheguei a pensar que em vez de cavalos talvez mulas ficassem melhor na frase. A defesa dos bancos tem sido feita por economistas tipo Maílson da Nóbrega e outros, por encomenda. Mas lógica e demonstrativos não aparecem. O máximo que dizem é tratarse de assunto complexo, à moda do conselheiro.
Acácio, o senhor falante das coisas óbvias e redundantes, ditas com pompa e circunstância.
Agora com a taxa Selic baixando, descobrimos que não são apenas os bancos e financeiras que adoram juros. Os agentes econômicos do varejo também. Sempre ganharam com as prestações, daí a resposta irritante de o preço à vista ser o mesmo que o das “quatro prestações sem juros”.
Ninguém quer saber de concorrência nem de aumento da produtividade. O negócio é botar a margem de lucro lá em cima e fatiá-la em prestações. Como o brasileiro, como diz o outro, é um país grande e bobo, não queremos saber se a coisa vale ou não, desde que as prestações caibam nos bolsilhos. Noutras palavras, nos deixamos furtar, em vez de gritar “pega ladrão!”
Estão a pipocar na imprensa artigos e teses dizendo que os preços vão subir porque as prestações serão menores, comprovando o que estou a dizer. É o país das contradições. É a 6ª economia do mundo, mas é subdesenvolvido em tudo. Nossos preços estão inflacionados pela ganância dos juros, custos trabalhistas e tributação irracional. E todo mundo tem culpa no cartório: os bancos, os comerciantes, os sindicatos, o governo e nós mesmos, os tolos compradores.
Quanto aos banqueiros, Cláudio Gradilone nos deu conta (Isto é dinheiro de 21/3) do depoimento de Greg Smith ao jornal The New York Times, como ex-executivo do Goldman Sachs: “Já não pensamos mais em como atender nossos clientes, mas sim em como tirar o máximo de dinheiro deles o mais depressa possível.” Não se pode dizer que Greg Smith e seus juízos estão restritos a Wall Street ou à cidade londrina. Para lá da desregulamentação do setor e da podridão ética que levaram os bancos a gerar as grandes crises dos créditos subprime, raiz dos problemas por que passam todos os países, o banqueiro é usurário e sem escrúpulos, no geral.
Sob a desculpa “do risco sistêmico”, receberam ajudas polpudas dos governos nacionais nos EUA e na Europa. Agora deixaram nas mãos do povo pagar as dívidas nacionais com recessão e desemprego nos países centrais. No Brasil recusam-se a reduzir as margens de lucros, “em nome dos acionistas”.
Sem medo de errar, são os principais responsáveis pela “cultura” dos altos preços praticados no Brasil. Somos um país de agiotas e de cidadãos de segunda classe, “fantoches” no dizer de Greg Smith. O modelo baseado no consumo massivo chegou ao fim. Agora é assim: mais crédito, mais inflação, mais juros! “Stop and go”. Não iremos a lugar nenhum. É como andar na esteira, não importa a velocidade.
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