Será tão difícil separar o povo brasileiro do seu presidente, que reteve o assassino italiano (Battisti)? Ao que tudo indica, os italianos não são capazes de fazê-lo.
Pelo menos 30% dos brasileiros têm algum sangue italiano. Depois dos portugueses, são o grupo étnico, à frente dos galegos (da região espanhola da Galícia), que mais adicionou sangue europeu aos brasileiros, batendo de longe os alemães e outras etnias europeias, especialmente no Sul do Brasil. Os portugueses vieram primeiro como conquistadores e depois como imigrantes junto com outros grupos, incluídos os sírios-libaneses e judeus, pelo simples fato de que em seus países e lugares havia fome e crises econômicas. Os negros, com sua força de trabalho, atribuíram 30% ao nosso sangue. Vieram à força porque os europeus civilizados os trouxeram como escravos, que foram deixados ao deus-dará após a abolição. Índios, pele amarela, contribuíram com 20%, especialmente no Norte/Nordeste e Centro-Oeste, onde o branco serviu-se do estoque feminino para procriar sem peias nem lei, gerando bastardos, um ror de gente sem eira nem beira. Somos, pois, multiétnicos e – felizmente – miscigenados, mas, infelizmente, desiguais socialmente. Vimos já as razões. Vivemos juntos e misturados no amor à nossa bandeira, ao nosso futuro, ao nosso modo de ser, sem discriminações e com elevado índice de mobilidade social. O racismo é marginal e cadente. Não temos queixas nem rixas com outros povos.
Fomos campeões e vice-campeões de vôlei de praia na Itália. A final verde e amarela deu-se sob vaias. Gostaria de saber o que os voleibolistas brasileiros têm a ver com a decisão de Lula, confirmada pelo Supremo Tribunal (STF), negando a extradição de um criminoso italiano. O que a senhora italiana que passou por mim tem a ver com o “bunga-bunga” do Sr. Berlusconi? Os brasileiros não fizeram um plebiscito em prol de Battisti. Não foi um povo que decidiu. Aliás, as opiniões majoritárias no Brasil foram em prol do pedido italiano. Agora, um tal Tabucchi deu entrevista dizendo que não vem ao festival de literatura no Brasil, em Parati, em represália à decisão do STF. Não vai fazer falta alguma. A falar pelos cotovelos, melhor quedar-se por lá.
Com o título “O meu não ao Brasil de Battisti”, um artigo estampado na primeira página do jornal italiano La Repubblica detalhava as justificativas do escritor Antonio Tabucchi para não vir à Flip: “A recusa definitiva de extraditar Cesare Battisti, condenado por quatro homicídios, não constitui somente ofensa à república italiana, mas é também uma ferida que se inflige ao direito internacional”. De acordo com ele, o fato de o STF ter remetido a decisão da extradição ao então presidente Lula demonstra o quanto, no Brasil, “o Poder Judiciário é submisso ao poder político”. Para o escritor, o argumento do Executivo brasileiro de que Battisti poderia ser torturado na Itália é insustentável. Tabucchi mencionou a onda de rebeliões em presídios simultânea aos ataques do PCC em São Paulo, em 2006, como sinal de que é o Brasil quem deve cuidar de sua política carcerária. “Como não precisamos das observações de Lula para melhorar o sistema carcerário italiano, Lula deveria pensar em melhorar o seu: na revolta nas prisões de São Paulo, em 2006, a intervenção da polícia antimotim provocou a morte de 81 detentos, alguns deles queimados em suas celas”.
Será tão difícil separar o povo brasileiro do seu presidente, que reteve o assassino italiano? Ao que tudo indica, os italianos não são capazes de fazê-lo. Quem sabe tanto ódio e falta de educação não inspiraram Lula? Ao cabo, as penitenciárias italianas são exemplares? Sabe-se que a Ndrangheta, a Máfia e a Camorra Napolitana têm esquemas nos presídios italianos. Não faz muito tempo vimos julgamentos na Itália de membros das brigadas vermelhas expostos em jaulas, contra o princípio da dignidades da pessoas humanas, mesmo presos ou em julgamento. As decisões do STF e de Lula são censuráveis. Mas a censura não pode estender-se a um povo inteiro. Nós sabemos distinguir o sr. Berlusconi do valoroso e sofrido povo italiano. O caso Battisti nos veio de envolta com os fumos da emoção, por várias razões. Corre mundo que os seus colegas de crime, premidos pela delação premiada, o teriam feito de bode expiatório, à sua revelia. Além disso, a república francesa, vizinha da Itália, já havia negado a extradição do indigitado malfeitor. Por último, a mídia italiana, de direita particularmente, criou um clima de “vendetta” contra o extraditando favorecendo a esquerda do PT, daí a comoção dos nossos irmãos peninsulares ante a negativa brasileira. Ora, os italianos não podem ser parvos. Não, somente uma “bonaparte”, para relembrar Napoleão, o corso! De minha parte, fico com o ex-ministro Francisco Rezek. Para nós o dano é ter o STF cedido competência ao chefe do Executivo para decidir sobre extradição, um retrocesso institucional.
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