Sacha Calmon
Advogado, coordenador da especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e UFRJ.
Juliana Schincariol, ao reportar os fundos de ações, pondera: o projeto de lei da segunda fase da reforma tributária traz um dispositivo que tem potencial para afastar investimentos estrangeiros no país por meio de private equity, na visão da indústria. O entendimento é de que, como a estrutura dos fundos de investimentos em participações (FIPs) como o texto do projeto de lei foi apresentado ao Congresso tem potencial para autuações retroativas do fisco, aumentando a insegurança jurídica no país.
O arranjo dos fundos segue uma lógica internacional. O gestor de private equity constitui diferentes veículos de investimento no exterior para fazer captações e alocar investidores, que em geral são fundos de pensão, family offices e fundos soberanos. Nessas estruturas internacionais, o gestor acaba tendo uma pequena participação em cada um desses fundos e aparece como “general partner”, apesar de manter a tomada de decisões em caráter fiduciário, ou seja, atende ao interesse dos cotistas.
Essa estrutura, no entanto, foi questionada pela Receita Federal. Na visão do fisco, não atendia ao chamado “teste dos 40%”. A Lei 11.312, de 2006, determina que o investimento estrangeiro por meio de FIPs é isento de tributação desde que se cumpram alguns requisitos, e entre eles a regra de pulverização…
O benefício não será concedido ao cotista que, isoladamente ou em conjunto com pessoas a ele ligadas, represente 40% dos fundos.
O texto enviado ao Congresso na semana passada esclarece que o fato de o cotista ter o mesmo gestor não faz dele parte ligada, o que, em tese, não estava na Lei 11.312. No entanto, o que foi visto como um problema é que coloca esse entendimento como válido a partir de 1º de janeiro de 2022.
Na visão da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (Abvcap), se o texto for aprovado como foi apresentado, abre incertezas em relação ao passado e há potencial para que as estruturas montadas antes dessa data sejam questionadas como partes ligadas. A entidade vai acompanhar a tramitação do projeto junto ao Congresso Nacional e tem como objetivo excluir esse trecho. “Já começamos a ver tentativas de mudança no PL. Querem alterar a tributação de dividendos e vamos tentar também. A nossa questão é menos visível, disse Piero Minardi”.
Se não houvesse a questão do prazo, o dispositivo seria positivo para a indústria, porque traz clareza quanto à questão das partes ligadas, na visão de Flávio Mifano.
“O efeito adverso para o passado é mais danoso. Convencer um investidor de que ele pode confiar naquela regra é uma tarefa muito complicada.”
Até o momento, três autos de infração da Receita questionam as partes ligadas, sendo que um deles já teve decisão favorável ao FIP em primeira instância. “Não temos dúvidas de que as autuações vão cair. Mas isso vai levar 10 anos e o investidor estrangeiro não entende isso. Ele está com o dinheiro retido aqui e correndo um risco cambial enorme. Ele diz que vai para um lugar onde será mais bem recebido.”
Questionamentos sobre a indústria de private equity ficaram mais evidentes após escândalos de má gestão e denúncias de corrupção envolvendo certos FIPs, que prejudicaram especialmente fundos de pensão e regimes próprios de previdência social (RPPS). Em 2016, a Receita autuou fundos sobre quem seriam seus beneficiários finais, o que na época representou um problema. O mercado hoje já consegue ter essa informação, mas o fisco não parou por aí. “Assistimos a alguns acontecimentos e é difícil desvinculá-los à saída de grandes fundos do Brasil”, disse o vice-presidente da Abvcap, Francisco Sanchez. O Carlyle, por exemplo, decidiu restringir sua operação no Brasil, enquanto o General Atlantic está vendendo portfólios. “O private equity é o capital de melhor qualidade do mundo. É um investidor estrangeiro que não vai embora no mês seguinte. Deveria ser o capital que mais gostaríamos de ter no Brasil.”
Mas o nosso Ministro da Fazenda, antigo dono de corretora de títulos e valores e não um professor de economia, especializado em títulos de crédito, hoje um campo enorme da chamada economia financeira (nunca teve visão percuciente desse tema). E, se falarmos de macroeconomia, a abranger um campo muito mais profundo e abrangente, a coisa fica pior ainda. Ele tem, porém, méritos, é de se reconhecer. É um acérrimo defensor do “teto de gastos” e do “orçamento público”.
Agora nos vem com duas “barretadas”: acabar com a dedução dos juros sobre o capital próprio e a tributação de 20% dos ganhos das sociedades de pessoas distribuídos aos sócios e sobre os dividendos das sociedades de capital. Haja paciência com tamanha incompetência!
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