Sacha Calmon
Advogado, coordenador da especialização em direito tributário da Faculdades Milton Campos, ex-professor titular da UFMG e UFRJ.
Os judeus representavam classe influente na Espanha e Portugal, atiçando o interesse da monarquia.
Eis que me deparo com um resumo desse assunto feito pelo médico Naftale Katz com a colaboração de Mariza Alves de Oliveira e Marcelo Guimarães.
Como é sabido, os judeus – por força de estarem na Península Ibérica desde o século 8 da era comum, aonde chegaram com a expansão árabe e marroquina na Península Ibérica – empurram a cristandade para o norte. Com a reconquista e as perseguições do catolicismo inquisitorial dos chamados “Reis Católicos” Fernando e Isabel de Castela, iniciaram-se barbaridades (a chamada Inquisição).
Os judeus eram, como os árabes, médicos, astrônomos, filósofos, ourives e exímios comerciantes. Os espanhóis e portugueses, embora a Igreja Católica fosse muito rica, pregavam a pobreza, combatiam a “usura” e impediam atividades bancárias, operações de crédito e letras de câmbio, o que desfavorecia extraordinariamente o comércio com a Europa do Norte, menos papal, com seitas distantes do catolismo. Ora, os judeus preenchiam essas lacunas do comércio interno e internacional.
A Inquisição tinha por alvo combater qualquer religião que não a católica, apostólica, romana, favorecer os reis e a nobreza, ávida por ouro e prata.
Fernando de Aragão e Isabel de Castela (1452-1516) foram intolerantes às mesquitas e sinagogas. Queriam com Portugal, daí o Tratado de Tordesilhas, dividir o mundo a descobrir entre os dois, mediante bula papal. E cobiçavam a riqueza do ativo povo judeu.
A Inquisição prejudicou a Espanha e Portugal por três séculos, ficaram atrás da França, Inglaterra, cidades italianas, Holanda e principados alemães. O catolicismo exacerbado e a opressão religiosa prejudicaram o desenvolvimento do mundo ibérico (Espanha e Portugal).
A Inquisição queimava “hereges” e “bruxas”, totalitária, antissemita, atingiu o Brasil, especialmente no Rio, Pernambuco e Vila Rica. O comerciante português os impediu em Salvador, “capital” da colônia, mas não totalmente.
Os judeus representavam classe influente na Espanha e Portugal, atiçando o interesse da monarquia. Os reis católicos Fernando de Aragão e Isabel de Castela solicitaram ao papa Xisto IV estabelecer o Tribunal da Inquisição para combater heresias, entre elas o judaísmo. A Inquisição foi uma instituição da Igreja Católica Romana. Entende-se por heresia a prática religiosa diferente da católica, e herege o praticante da heresia. A Inquisição sempre favoreceu a nobreza. A instituição manteve-se na Espanha por mais de três séculos e prejudicou o desenvolvimento do país nos segmentos político, econômico, social e intelectual. Em 1492, a Inquisição confiscou os bens de mais de 100 mil judeus espanhóis e permitiu aos reis católicos financiar a expulsão dos mouros, derrotando-os em Granada, último reduto mouro.
No vizinho português, o rei D. João II viu oportunidade financeira com os exilados e permitiu estabelecerem-se em Portugal com o pagamento de um tributo fixo. Os judeus só poderiam “permanecer por oito meses” e após o período “teriam barcos à disposição” para novos locais. Sabe-se que mais de 100 mil judeus expulsos da Espanha cruzaram as fronteiras, adentrando terras lusitanas. (De lá, sempre foram à Holanda e, quando possível, para o Brasil.) Rentáveis para Portugal, para ganhar tempo e evitar significativa perda com a saída dos judeus, o rei alegou que não haveria barcos na quantidade necessária para os expulsar e organizou um batismo forçado. Esse dia, na beira do Rio Tejo, milhares de judeus esperaram “navios que nunca apareceram”. As crianças menores de 14 anos receberam o batismo e foram retiradas de suas famílias e entregues a famílias cristãs. Foram batizados primeiro os jovens e depois os velhos. Assim, com o batismo forçado, os judeus “convertidos ao catolicismo” passaram a ser cristãos-novos e puderam permanecer em Portugal. Em 1496, a perseguição inquisitorial espanhola chegou a Portugal devido ao casamento de dom Manuel com a filha dos reis da Espanha. Nesse momento, uma pequena parte dos judeus pôde sair do país.
Judeus contribuíram para a formação das cidades portuguesas, chegando a constituir-se em 20% da população do país. Durante todo o reinado de D. João II não houve Inquisição. Seu sucessor, D. João III, solicitou a Roma a Inquisição em Portugal, embora o papa Clemente VII tentasse proteger os judeus com o Breve de Perdão Geral dos Cristãos- novos. Seu sucessor, o papa Paulo III, manteve a decisão e solicitou a anulação da lei de 1532, que proibia a saída dos cristãos-novos. Foram 30 anos de disputas entre o poder real e o poder religioso e, em 1536, D. João III conseguiu que o Santo Ofício atuasse em Portugal (período de maior intensidade em 1707).
Os judeus, privados de Estado e território, se espalharam pelo Ocidente e sempre foram prolíferos em obras e homens celebres, como Spinoza, Karl Marx, Rockfeller, Freud, Einstein e outros. Criou-se Israel, obra da ONU, após a 2ª Guerra Mundial. É saudável a derrota de Netanyahu, um direitista inclemente que governou Israel por mais de uma dezena de anos.
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