O governo está a atingir metade do mandato, com muito pouco a apresentar. A segunda metade será uma reedição piorada da primeira?
Peço licença a Ferreira e Fragelli para reproduzir em boa parte análises que compartilho, mas já foram publicadas.
O governo está a atingir metade do mandato, com muito pouco a apresentar. A segunda metade será uma reedição piorada da primeira?
No primeiro ano do atual governo, a despeito da falta de maioria no Congresso, para surpresa de muitos analistas, o saldo de reformas econômicas foi positivo. Com o decisivo apoio de Rodrigo Maia na Câmara e Davi Alcolumbre no Senado, aprovou-se uma importantíssima reforma que vinha sendo adiada há um quarto de século, a da Previdência. Desde FHC, cada governo avançou incrementalmente nessa área, mas somente a reforma de 2019 extinguiu a aposentadoria por tempo de contribuição, embora professores do ensino básico e militares tenham preservado a aposentadoria precoce.
Bolsonaro enviou a reforma ao Congresso, mas atuou nos bastidores para enfraquecê-la, retirando de seu escopo a sua clientela mais fiel. Graças ao Congresso, e apesar de Bolsonaro, aprovou-se uma boa reforma da Previdência que desviou o país de uma trajetória explosiva, bem como reduziu desigualdades.
No início de 2020, já tendo o governo enviado ao Congresso as importantes PECs do pacto federativo, emergencial e administrativa, havia esperança de novo avanço na pauta de ajuste estrutural, mas não, nada ocorreu!
Outras reformas de menor custo político, por tratarem de temas técnicos, o Congresso aprovou, casos das novas leis do saneamento e de falências, finalmente aprovadas, e a lei de independência do Banco Central, ainda em negociações. No caso da reforma tributária, o governo permanece sem uma proposta. É estranho. Guedes quer uma CPMF para chamar de sua. Fala muito e não faz nada.
Em outras áreas, o governo Bolsonaro continua a mostrar, diariamente, sua incompetência. No meio ambiente, a destruição de florestas passou a ser problema de governo, com graves implicações na Europa. Na política externa, o ataque a europeus, a subserviência a Trump e a hostilidade à China, maior importador de produtos brasileiros, é visão pequena puramente ideológica.
A facilitação na compra de armas e munições pela população é tema pessoalmente liderado por Bolsonaro (sinaliza uma total falta de foco…). A partir de março, a eclosão da pandemia deixou o governo perplexo. Os erros de avaliação do presidente, menosprezando a gravidade da COVID-19, com queda de dois ministros da Saúde, evidenciaram um governo totalmente desnorteado. Na área econômica, todo o planejamento do ano anterior, calcado na eliminação do déficit primário, foi transformado num gasto colossal. Acuado, Bolsonaro partiu para um confronto quixotesco contra as instituições. As denúncias envolvendo seus filhos o levaram a recuar.
Na área econômica, a insistência do governo em reeditar a CPMF indica baixa probabilidade de a reforma tributária ser aprovada. As reformas mais importantes para viabilizar a retomada do crescimento, justamente aquelas que exigiriam uma intensa e habilidosa atuação do presidente, têm pouca perspectiva de avanço. Enquanto isso, a dívida pública ultrapassa 90% do PIB, com prazo médio de vencimento cada vez mais curto. O teto de gastos, bem como as elevadas reservas internacionais acima de US$ 340 bilhões, constitui hoje as únicas amarras que contêm a crise de confiança no governo. Mas o teto de gastos e as reservas foram feitas antes pelo Congresso e pelo setor privado com o apoio do Banco Central.
A recente queda do dólar e a valorização do Ibovespa não se devem a melhorias no quadro doméstico, pelo contrário, mas às novidades no exterior. O início da vacinação no Primeiro Mundo e a perspectiva de racionalidade na política externa dos EUA, após a derrota de Trump, levaram à valorização dos ativos financeiros internacionais. Sem mais ganhos relevantes a auferir, investidores estrangeiros destinam uma pequena parcela de seus portfólios a comprar ações e títulos públicos brasileiros, provocando elevações de preços no mercado local. São movimentos especulativos, e não estruturais.
Nada de relevante ocorrerá até a eleição dos futuros presidentes da Câmara e do Senado, em fevereiro. A partir de março, a agenda parlamentar evoluirá lentamente, com vistas às eleições de 2022.
Ao completar 2020, o Brasil deve registrar os piores resultados para uma década em crescimento econômico e variação de PIB per capita dos últimos 120 anos – o que ocorreria mesmo sem a pandemia. Estudo da FGV tem estimativas de recuo do PIB de 4,4% em 2020, com retração de 5,1% no PIB per capita. Caso esses dados se confirmem, a FGV calcula alta média de 0,2% para a economia na década entre 2011 a 2020. O PIB per capita deve encerrar com recuo médio de 0,6% no período. Dói lembrar que em 2010 o país cresceu 7,8%…. Não sou lulista, mas ele nos entregou um país estruturado. Depois dele veio a década perdida (0,2% de crescente econômico), a segunda nos últimos 50 anos!
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