Um Estado à mercê da paranoia e uma sociedade amedrontada formam ambiente favorável às ditaduras
O pródromo é Trump e o êmulo é Bolsonaro. O êmulo – diziam os gregos da Antiguidade – segue o pródromo como farol, mesmo avariado.
O que se passa aqui, com a estúpida conduta do êmulo, se passa lá como padrão.
“Eu não ligo para a campanha”, disse Trump. “Mas, na mesma semana, exigiu que os cheques do Tesouro à população de baixa renda chegassem com seu nome. Logo após suspender o financiamento à OMS, ele se viu isolado numa reunião do G7, enquanto os outros líderes vocalizaram seu apoio à organização. Com efeito, Trump vem subindo recorrentemente o tom contra a China, em insinuações nunca bem explicadas!”. (NY Times.)
Superada a atitude inicial de minimizar a ameaça do vírus, Trump tem oscilado entre forçar a reabertura da economia e endossar a cautela de sua equipe sanitária, provocando confusão e tensão com os governos regionais, sobre os quais, no dia 13 de abril, reclamou “autoridade total”.
No dia em que a Casa Branca anunciou seu plano, os EUA contavam já quase 668 mil infectados e 33 mil mortos – de longe as maiores cifras mundiais. No início de março, Trump chegou a dizer que todo americano seria testado. Mas a testagem está empacada em 140 mil testes semanais – 10 vezes abaixo do ideal – e só 1% da população foi testada. Mais de 22 milhões de americanos já entraram na fila do desemprego.
“Longe dos melhores paradigmas de estadistas, Bolsonaro, sempre ansioso por emular seu ícone, pode adotar algo deste comportamento bipolar. Ainda estaria longe do ‘meio virtuoso’. Mas qualquer passo além do círculo cerrado de sua obsessão eleitoreira já seria um passo rumo à sanidade.” (O Estado de S.Paulo.) Tudo indica que o Bozo não fará nada salvo esquiar no Paranoá, o lago que Juscelino criou em Brasília.
Enquanto isso, Wuhan (12 milhões) volta à normalidade e a província de Hubei, como toda a China, volta à produção e à vida, mostrando a eficiência de sua liderança, que os direitistas brasileiros, à medida que o Centrão vira a bancada do governo, insistem em difamar, como lhes é peculiar.
Aqui, o “culto” à personalidade do “chefe” sofreu grandes desgastes entre os que votaram em Bolsonaro apenas para deter o PT, meu caso, e entre os que nele votaram de boa-fé (as decepções continuam, pois o presidente é boçal)!
A prova disso são as manifestações dos eleitores de São Paulo, panelaços, o “país” mais rico e produtivo da América do Sul.
Vera Magalhães nos revela bastidores preocupantes: “Derrubado Luiz Mandetta e Moro, o ‘inimigo interno’ que Jair Bolsonaro resolveu combater em meio à maior emergência de saúde do planeta, os esforços do presidente da República se voltam agora para uma tríade de adversários: Rodrigo Maia, João Doria e o STF, com menor intensidade (até porque, desde que assumiu, ele mostra certo temor de atacar o Judiciário com a sem-cerimônia com que atinge outros poderes e instituições).
A razão é a velha paranoia presidencial. Acossado por fantasmas persecutórios desde muito antes de ser presidente, Bolsonaro vê um complô para derrubá-lo. O foco do momento é o presidente da Câmara, até pela importância do cargo para um eventual processo de impeachment. Para atiçar ainda mais o medo do capitão, a condição definitiva para o impeachment avançar foi a decisão de Eduardo Cunha, então presidente da Câmara, de levá-lo a cabo depois de a presidente o desafiar. Bolsonaro estava lá. Ele sabe que, quando a Câmara vira, o presidente está em apuros.
Bolsonaro segue atormentado por seus fantasmas. Isso não seria um problema sério se os meios para demonstrar sua paranoia fossem os de sempre: guerrilha nas redes sociais e entrevistas descompensadas. Porém, há indícios de que aparelhos de Estado estão sendo usados para alimentar a paranoia, o que aumenta em muito a gravidade da situação. Há indícios de que a Abin, a agência de inteligência do governo, está sendo usada para espionar Maia, Doria e sabe-se lá mais quem…”
Em meio a uma fala sem pé nem cabeça quando consumava sua birrenta troca de ministro da Saúde, Bolsonaro lembrou que é sua prerrogativa decretar estado de sítio. Não é a primeira vez que essa expressão aparece, meio “sem querer”, desde que a crise começou. É preciso que as instituições reforcem a vigilância, porque chefe de Estado paranoico e autoritário; um risco de “golpe” inventado (sustentado nas redes sociais); Estado à mercê da paranoia e sociedade amedrontada formam ambiente favorável às ditaduras.
Está claro que o governo não é presidido por um homem são.
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