No Brasil, a duração de um processo regular demora 10 vezes mais que nos EUA (time is money) e o aparato judicial aqui ajuda os sem-razão.
O país está novamente tranquilo, pois o fator primeiro da turbulência não será candidato a presidente da República. A uma, porque réu condenado em segunda instância está, ipso facto, impedido pela Lei da Ficha Limpa, visto que a condenação inclui crimes contra a administração pública. A duas, porque o país pressente que ele, Lula, é um fator de desunião.
Há semanas, a corte máxima reiterou a tese de que o réu com sentença condenatória conferida responde preso e, nessa condição, requer e recorre. Quando em matéria penal, ocorre na segunda instância a confirmação da sentença (à vista dos fatos, das provas e do direito aplicável ao caso pelo tribunal de revisão, em grau de recurso), não restam recursos de mérito para o Pleno do tribunal, para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF), que não apreciam fatos ou provas, somente as questões de direito, que no caso de Lula nem existem.
Lula, em desespero, antevendo o inapelável desfecho da ação criminal que lhe é movida, cometeu outra imprudência ao contratar o ex-ministro Sepúlveda Pertence, seu amigo e simpatizante da esquerda, para reescrever a história do Brasil no STF. O ministro Pertence é, indubitavelmente, jurista de escol e conceituado criminalista, mas obviamente não faz milagres. O STF, por ele, jamais se transformaria numa corte imberbe e impressionável, a ponto de se agachar perante a nação, que vê, majoritariamente, Lula como demagogo e corrupto. A defesa de Lula, em verdade, quer o STF mudando sua jurisprudência para beneficiar Lula. O STF, como já se disse, entende que proferida a sentença criminal na segunda instância, o réu, no caso Lula, deve responder preso.
Para o público leigo é preciso dizer que o sistema judiciário brasileiro, seja a Justiça Federal (União), seja a estadual (dos estados), atua em duas instâncias, examinando os fatos e o direito aplicável, o suficiente para garantir a presunção de inocência de todos nós. Assim, existem os juízes monocráticos ou singulares que atuam sozinhos na condução dos processos, podendo condenar ou absolver, e aqui estamos a falar de processo penal – cabendo em qualquer hipótese recurso das partes envolvidas e até mesmo de ofício (o próprio juiz submete sua decisão ao tribunal a que está submetido), para os colegiados de revisão para assegurar certeza às decisões condenatórias (justiça).
O processo julgado por um juiz é reanalisado por três sobrejuízes, em conjunto, no tribunal. Um conhece a matéria em detalhes. É o relator. O outro revisa, ponto por ponto, o voto do relator. Um terceiro fica disponível para desempatar caso haja divergências entre o relator e o revisor. Tudo isso é para assegurar segurança jurídica aos cidadãos jurisdicionados e, principalmente, ao réu.
No caso de Lula, a sentença do destemido e modesto juiz Moro foi confirmada pelos três sobrejuízes (relator, revisor e o vogal), que estudaram exaustivamente o caso, os fatos subjacentes e o direito aplicável. Não apenas confirmaram a sentença, como aumentaram a pena imposta em primeiro grau de jurisdição. Equivale dizer que o réu mereceu a condenação e que a pena no caso em exame, tratando-se da pessoa apenada, a quem incumbia jamais cometer delitos, foi majorada. É preciso dizer mais?
Um ex-ministro do Supremo lutou muito para fechar o sistema em duas instâncias, como nos EUA, na Itália, na maioria dos países civilizados. Falo do ministro Cezar Peluso. Ele sempre criticou os enxames de casos que iam para o STJ e para o STF. É que o STF deveria apenas guardar a Constituição Federal (CF), vigiar para que leis e atos normativos não afrontassem a CF, e o STJ deveria apenas receber recursos para ver a compatibilidade das decisões tribunalícias com a sua jurisprudência. Daí ser chamado de unificador da jurisprudência ou tribunal da federação brasileira.
Na prática, o sistema desandou com a atribuição de muitas competências aos tribunais superiores, impactando as decisões, que não são rápidas e nem sempre claras, pois a pressa é inimiga da perfeição.
Fala-se muito, hoje, em reformas. Pois em verdade vos digo que uma há, imprescindível, a reforma do Judiciário, para torná-lo ligeiro e justo. A rapidez sem justiça e justiça sem rapidez são intoleráveis injustiças. Nos primórdios da República, o príncipe da advocacia brasileira, o jurista Rui Barbosa, dizia com acerto que “justiça tardia não é justiça, mas injustiça manifesta”. Agora, digo eu: se assim era no início do século 20, mais injusto ainda será o juiz que tarda em dizer o direito na segunda década do século 21.
No Brasil, a duração de um processo regular demora 10 vezes mais que nos EUA (time is money) e o aparato judicial aqui ajuda os sem-razão! É protelatório. Mais que isso – nos planos do direito privado e tributário – a mora jurisdicional envenena o ambiente dos negócios, eterniza disputas e tolhe o crescimento da nação.
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