Merecem repúdio da sociedade brasileira deputados e senadores, por tentar submeter o STF e engavetar emendas à Constituição já votadas
Juristas do PT mostravam-se semanas atrás preocupados com o ativismo judicial do ministro Gilmar Mendes, que suspendera mediante liminar o andamento de lei ofensiva ao princípio fundamental do pluralismo político-partidário (para negar a novos partidos o acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita, inviabilizando-os politicamente). Há meses os reconhecera o Congresso ao PSD de Kassab, aliado da base governista. Agora interessada em obstar dois novos partidos a ela contrários, o decorrente da fusão do PMN-PPS e a Rede de Marina Silva, o Congresso quer mudar a legislação partidária.
Para esconder o casuísmo, passou a dizer que o país tem partidos de sobra. Dá-se que a Constituição os assegura como expressão da democracia. Há meses, o Poder Judiciário convalidara o direito do PSD ao fundo partidário e ao tempo televisivo, precedente judicial esforçado no princípio da igualdade dos partidos e na proporcionalidade de suas representações. Agora, a velocidade na tramitação da lei mostra casuísmo e golpe ao princípio fundamental do plurarismo político. A República Federativa do Brasil é um Estado democrático de direito fundamentado no pluralismo político (art. 10), a envolver o paradigma da igualdade para partidos em formação antes da lei restritiva. No caso brasileiro, a Constituição diz expressamente que: “Art. 60, parágrafo 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais”.
Na espécie, a lei faz perigar a eficácia isonômica do voto direto, secreto, universal e periódico, na medida em que desiguala atores da cena eleitoral, os partidos. Mudanças é claro podem ocorrer, mas antes de as pessoas iniciarem seus passos sob a égide da legislação em vigor (segurança jurídica). O STF tem o poder-dever de trancar, em controle prévio de constitucionalidade, as deliberações do Congresso relativas a emendas constitucionais que pretendam alterar matérias imodificáveis (cláusulas pétreas) por razões políticas. As liminares, portanto, quer se concorde ou discorde delas, são juridicamente possíveis quando invocados para protegê-las. Ao nosso sentir, o ministro Mendes não extrapolou as competências da Corte Constitucional, até porque a liminar que concedeu foi para trancar projeto de lei que, na prática, iria fazer o que nem emenda poderia cogitar. Por economia processual, a pedido de congressista, concedeu a liminar. Quem pode o mais pode o menos.
É mais difícil defender a liminar da ministra Carmen Lúcia, suspendendo a eficácia da lei longamente desejada e duplamente votada pela maioria esmagadora do Congresso Nacional, alterando a distribuição dos royalties do petróleo entre os estados-membros da Federação. Duas vezes, digo eu, porque o Congresso aprovou a matéria e ainda derrubou o veto presidencial que se lhe seguiu. Além do mais, nenhum contrato foi alterado (segurança jurídica); tratava-se apenas de uma conta aritmética que a Nação quis mais isonômica entre os estados-membros da Federação. Direito algum possuem os chamados “estados-produtores” a montante maior, pois a repartição, pontua a Constituição, dá-se “nos termos da lei” sobre os recursos naturais extraídos da plataforma continental e da zona de exploração econômica exclusiva. Tais lugares não são territórios deles nem tampouco do Brasil. Este, como sujeito de direito público internacional, tem apenas a prerrogativa, pelo Tratado Internacional de MontegoBay, de explorar as riquezas lá existentes, o que recomenda a distribuição equitativa dos royalties ao revés de favorecer apenas três estados da Federação. Num e noutro caso bem pode ocorrer a modulação dos efeitos. No caso dos royalties, a lei nova deverá viger para o orçamento de 2014. No caso dos partidos, somente na próxima legislatura, após as eleições do ano entrante.
Não será com jogo de palavras que o ativismo acadêmico abalará a confiança do povo brasileiro na Suprema Corte. Dela poderemos discordar, jamais descaracterizá-la. Quem está a merecer o repúdio da sociedade brasileira são os senhores deputados e senadores pelo ativismo legislativo; submeter o STF ao Congresso e engavetar emendas à Constituição já votadas. Merecia censura a atitude do presidente do Senado que se negava a promulgar a Emenda Constitucional que criou quatro novos tribunais regionais federais, promulgada à sua revelia na quinta-feira, por estar viajando. Exercia poder de veto por omissão. Um só parlamentar não pode anular o poder constituinte reformador. Quem pode é o plenário do STF.
Ativismo é o que não falta. Mesmo depois do advento da lei que proíbe embargos infringentes em ações penais originárias no STF, os mensaleiros insistem em transformar a Corte em tribunal de apelação de suas próprias decisões. É um acinte.
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