O fim do Festival Internacional de Documentários (2013) deu-se a consagração de “The Gatekeepers”, do israelense Dror Moreh. O The New York Times comenta que o filme passa a ideia – corroborada por seis ex-chefes vivos do Shin Bet (serviço interno de inteligência de Israel) – de que a ocupação progressiva da Cisjordânia é imoral, além de ineficiente para a segurança futura de Israel, onde vivem 1,7 milhão de cidadãos palestino-israelenses, com famílias cada vez mais numerosas (bomba demográfica), sem contar os que vivem em Gaza e Cisjordânia, às suas portas, daí o muro que segrega Israel.
Benjamin “Bibi” Netanyahu disse que não viu nem verá o filme. Tolice, deveria fazê-lo. Israel deveria retirar-se incondicionalmente como já o fez em Gaza, em 2005. Teria o apoio incondicional de 99% da comunidade internacional, inclusive dos EUA. Somente um grande estadista o fará. Jamais Bibi, raivoso e extremista a ponto de nos lembrar a face odiosa de um general da Gestapo, sua crença na superioridade racial e a mania de anexar terras alheias, pretextando direito ancestral aos seus espaços vitais.
Outro filme franco-israelense-palestino Cinco Câmeras Quebradas de Emad Burnat e Guy Davidi, registra de maneira nua e crua a truculência dos assentamentos israelenses na Cisjordânia. O assunto está em voga internamente. As últimas eleições mostraram o surgimento de um partido de centro, a confrontar a coalizão direita-extrema direita que ora governa Israel (nascido quase socialista com o saudoso partido trabalhista, ora em recuperação). Aliás Bibi viu-se obrigado a formar o governo com o partido centrista. Externamente o atual governo de Israel, por sua intransigência e expansionismo, isola-se cada vez mais em face da Rússia, Europa, China, Japão, o Oriente em geral, África e América Latina. A questão central da paz é justamente a ocupação da Cisjordânia, a parcela mais amigável da Palestina.
Gabriela Walker, em reportagem isenta, bem mostra a desrazão judaica: “Três analistas independentes integraram uma missão do conselho que avaliou as condições de vida dos palestinos desde março de 2012. ‘Em conformidade com o artigo 49 da 4ª Convenção de Genebra, Israel deve cessar todas as atividades de assentamento sem condições prévias’, declarou Christine Chanet, que chefiou o grupo”. A Convenção, assinada e ratificada por Israel em 1949, determina que a população civil de um Estado que exerce a ocupação não pode ser transferida para o território ocupado. “Desde 1967 quando ocupou a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, Israel participou ativamente no planejamento, na construção, no desenvolvimento e na consolidação de colônias judaicas nos territórios palestinos”.
O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas recomendou a retirada imediata de colonos israelenses de assentamentos no território palestino da Cisjordânia. Um relatório divulgado na sede do órgão, em Genebra, aponta uma série de violações dos direitos humanos e condena a expansão territorial de Israel. Nos últimos 46 anos, 250 assentamentos foram construídos na Cisjordânia e cerca de meio milhão de pessoas foram deslocadas para a região. Como consequência, milhares de palestinos foram forçados a abandonar suas casas, seja por desapropriação, pela intimidação violenta ou pela imposição de restrições no acesso à água, a plantações e a serviços básicos.
Segundo os analistas, “91% das queixas apresentadas pelos palestinos entre 2005 e 2012 foram arquivadas, com base em um estudo da ONG Yesh Din”. O relatório deve ser discutido oficialmente em 18 de março pelos representantes dos 47 países-membros do Conselho de Direitos Humanos. O que nos reconforta é a existência de instituições, ONGS, jornais e pessoas em Israel que lutam pela paz, a justiça e a igualdade, em favor dos palestinos desassistidos e desesperados, a ponto de se explodirem à falta de armas eficazes, políticas eficientes e esperança no futuro.
O que Israel irá dizer? Que não faz o que o relatório aponta? Mais uma vez afrontará a ONU? Tenho para mim – como exponho em livro no prelo Da monolatria para o monoteísmo – que alguns ortodoxos judeus ainda estão contaminados pelo ethos violento do Deuteronômio, por causa de 200 anos de submissão ao império assírio, por volta dos 700 a.C., segundo Karen Armstrong. A insistência anexionista é intolerável. O resto do mundo admira Israel, mas abomina a anexação da Palestina, tanto quanto o shoah de Hitler. Não se pode tapar o sol com a peneira, trazendo à mesa questões outras da conturbada região da Síria-Palestina. A segurança do Estado de Israel, de resto potência militar inigualável na região, além de potência atômica, não é razão suficiente para justificar a anexação de propriedades alheias, muito pelo contrário. Está escrito na Torah (a bíblia judaica): não roubarás!
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