Ao nomear Lula ministro, a presidente embaraçou o livre exercício do Judiciário, alterando o princípio do juiz natural
A presidente veio a público dizer que nunca cometeu atos reprováveis. Quando militava na Polop, VAR-Palmares e Colina, sequestrou embaixadores, assaltou bancos e conspirou. Julga-se, pelo que fez, uma heroína contra os governos da Revolução de 1964, mas aceita pela sociedade (eu nunca considerei legítimo o movimento de 1964, fui preso e livrei-me por habeas corpus). Mas não se pode negar que o povo brasileiro convalidou o golpe militar e os governos que se sucederam (de 1964 a 1985). Não houve guerra civil. Terminou com a eleição indireta de Tancredo Neves, que morreu antes da posse, daí ter sido sucedido pelo vice, José Sarney.
Cabe examinar os seus atos em face das leis da República, a ver se cometeu atos delituosos contra a Constituição e leis orçamentárias em período absolutamente democrático, ao revés dos chamados governos ilegítimos da “Revolução de 64”. Para logo, não é preciso ter furtado, bastam sua omissão e conivência, pois sempre foi adepta de que os fins justificam os meios.
Leandro Mello Frota, do Instituto Millenium, acha que Dilma transgrediu a Constituição e as leis da República: “O artigo 85 da Constituição trata de crime de responsabilidade, e os incisos V e VI abordam especificamente o tema. O V fala da probidade na administração, o zelo e o cuidado com a ética, e o VI fala sobre a Lei Orçamentária. As ‘pedaladas’ ferem o artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que proíbe claramente as operações de crédito entre as instituições financeiras estatais e o ente politico que as controla. A União não poderia ter feito um empréstimo com a Caixa Econômica Federal. A Lei 1.079 de 1950, define que esse fato é crime de responsabilidade com reforço no artigo 4º (probidade na administração) e o 6º (a Lei Orçamentária). A presidente feriu a Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal”. A presidente responde pelo governo, acrescentamos nós, caso contrário seria irresponsável às expensas dos subordinados. Anotem que Dilma governou durante a campanha, não se licenciou, emendou os períodos. Não há falar de mandato findo, mas continuado.
Denuncia o jurista Ives Gandra: “Dilma foi alertada em 2013 de que as ‘pedaladas’ eram ilegais e ao mesmo tempo poderiam provocar a perda do grau de investimento do Brasil. E a presidente não tomou nenhuma providência. Então, nesse particular, a responsabilidade é direta. A presidente fez os empréstimos e não poderia fazê-los. A unanimidade do TCU de considerar a ilegalidade das ‘pedaladas’ demonstra realmente que ela cometeu crime de responsabilidade.”
Trago à colação Oscar Vilhena, professor de direito constitucional da FGV-SP: “A lei de 1950 (que define os crimes de responsabilidade) é muito ampla e traz, entre seus dispositivos, a ofensa à Lei Orçamentária. Evidentemente que aquele que gasta fora da lei e cria um crédito que não estava previsto infringiu a lei. A condição básica é que a infração é passível de ser punida como crime de responsabilidade. Mas o juízo é político. Pontes de Miranda (jurista) fala que a natureza do crime de responsabilidade não é penal, é político-administrativa. O julgamento se dá por instância política, no Senado”.
Sem me alongar, é aplicável o artigo 10 da Lei 1.079/50, a mesma que decretou o impeachment de Collor. Eis os fatos e a lei: Dilma editou uma série de decretos sem número, que resultaram na abertura de créditos suplementares, sem autorização do Congresso Nacional. O artigo 10 da Lei 1.079/50 caracteriza o ato como crime de responsabilidade. Por oportuno, a Lei de Responsabilidade Fiscal é o maior contrapeso à irresponsabilidade dos governantes. É patrimônio dos governados. É garantia constitucional de bom governo.
De início, o impedimento seria golpe. Não colou. Agora, o impeachment é constitucional, mas sem causa, é golpe. Mas esse juízo é exclusivo do Congresso Nacional, em processo político, sem qualquer possibilidade de recurso ao STF, cujo controle é meramente formal.
Em 15 de março, ao nomear Lula ministro, a presidente embaraçou o livre exercício do Judiciário, alterando o princípio do juiz natural. Prevaricou quando mandou o tal Messias entregar-lhe um termo de posse por ela assinado sem ter havido ato de posse. Satisfez interesse pessoal. É administrativamente ímproba. Ela disse: “Use só em caso de necessidade”, ferindo o 85, II e V, da CF/88. Abusou do poder para evitar a suposta prisão de Lula. Por menos grampearam Nixon e abriram seu processo de impedimento. Ele renunciou por ter mentido. Que nos sirva de exemplo. Quão diferente da nossa é a simples e eficiente democracia americana! Sob o comando de um juiz federal, especialmente designado, que lá não existe esse anacronismo do “foro privilegiado”, Nixon foi inquerido e seria julgado, mesmo presidente, por um juiz federal. Isso sim é igualdade perante a lei.
Faça seu comentário